Com o objetivo de chamar a atenção para a realidade atual do câncer de mama e a importância do diagnóstico precoce, está acontecendo o ‘Outubro Rosa’, uma campanha que tem movimentado homens e mulheres em vários países.
O município de Nova Venécia também aderiu à campanha. Várias Unidades de Saúde promovem palestras, encontros e caminhadas com o objetivo de chamar a atenção sobre os perigos da doença.
O doutor Carlos Henrique Ribeiro Pinheiro é um mineiro, médico ginecologista residente – há 26 anos – em Nova Venécia e trabalha na prevenção à saúde da mulher, atendendo na Clínica de Ultrassonografia Veneciana e no Centro de Saúde.
Nesta entrevista ele fala sobre a doença e os mecanismos para elas se cuidarem.
Correio9 – Qual a importância da campanha do Outubro Rosa?
Dr. Carlos Henrique – A mulher tem toda uma função primordial porque ela gera vida, ela tem a vida reprodutiva, ela é quem consegue com o seu corpo e a sua feminilidade gerar um ser humano. É através dessa capacidade que a mulher tem que ela também encontra, ou nasce, com uma predisposição em ter algumas doenças.
O câncer de mama está intimamente relacionado ao hormônio feminino. Mulheres que passam a maior parte do tempo expostas aos efeitos do hormônio feminino, entre eles, o mais especial, o estrogênio, se essas mulheres tiverem uma predisposição para desenvolver essa doença, ela se torna um fator importante. Então, a prevenção é importante, a conscientização, de alertar essas mulheres é muito importante e o mais importante de tudo dessa conscientização, desse incentivo às mulheres em buscarem se cuidar melhor, é porque nós queremos valorizar a vida, e não valorizar a doença.
A campanha é fundamental pois incentiva as mulheres a cuidarem de si próprias, porque, através delas, existem outras pessoas que dependem delas, sejam seus pais, seus companheiros, e principalmente seus filhos. Pela lei da vida existe toda uma situação que passa pela mulher. A campanha tem esse objetivo maior, de lembrar as mulheres de que não podem se esquecer de cuidar da sua saúde, de procurarem orientações de profissionais capacitados, de equipes de saúde, as secretarias de Saúde dos municípios, os profissionais que trabalham na área da saúde da mulher. É interessante e importante lembrar isso, valorizar a vida, não valorizar a doença. A campanha é para proteger a mulher.
Correio9 – É possível que a pessoa descubra sozinha se ela tem o câncer de mama?
Dr. Carlos Henrique – O primeiro acesso da mulher é o ginecologista, mas, quem cuida realmente das patologias da mama é o mastologista. Para ser mastologista, antes é preciso ser ginecologista, você não pula etapas. Se eu quiser ser mastologista, eu vou ter que estudar mais um tempo, estudando mais especificamente a mama para cuidar da saúde da mulher. De uma maneira geral, as mulheres passam primeiro pelo ginecologista e nos grupos de trabalho, nas equipes de saúde médica dos municípios, existem vários profissionais envolvidos nisso aí, então, o cuidado que eles têm é orientar a mulher sobre o autoexame.
O autoexame é muito limitado, mas tem uma simbologia, para que essa mulher procure se tocar, para que ela procure se conhecer, se entender. Ou seja, a partir do momento em que essa mulher passa a ter o cuidado de olhar as mudanças no corpo e estar atenta a essas mudanças e procurar orientação para que realmente ela possa perceber se há alterações ou não, por isso o autoexame é importante. Ele serve para alertar que ela está se olhando todo dia, está se vendo no espelho, e que ela tem que se tocar. A gente costuma dizer que a mulher que se toca é a mulher que tem coragem. Porque tem umas mulheres que têm receio de se tocar, com medo de descobrir alguma coisa.
A mulher corajosa é aquela que se conhece, que sabe as suas limitações, que entende as modificações do seu organismo, que tem a sua sensibilidade e tem a coragem de procurar informação. Porque se ela tiver no meio familiar uma genética que seja favorável para essa doença, a primeira linha de ataque vai ser a descoberta do corpo. Então o autoexame, o ato da mulher tocar as suas mamas é de fundamental importância, é a primeira linha de ataque. Ele nunca vai ser deixado de ser colocado em prática. Os médicos sempre vão orientar as mulheres a praticarem o autoexame, porque não dá para vir ao profissional da saúde da mulher todo mês, tem que ser incentivado e vai continuar durante muito tempo. A partir do momento que você consegue identificar quem realmente tem alteração, vai partir para os exames complementares, que são os exames de imagem.
Correio9 – Existe idade para a doença se manifestar?
Dr. Carlos Henrique – A doença em si, da mama, ela tem um período no qual tem maior possibilidade de se manifestar. Mas se você analisar que é uma patologia da saúde da mulher que está atrelada intimamente aos efeitos do hormônio feminino, o estrogênio, é a partir do momento em que a mulher tem condições de vida reprodutiva. Ou seja, desde o momento em que a menina começou a menstruar até o momento que a mulher sai da vida reprodutiva e entra no período da menopausa, é o momento em que ela tem que se cuidar. Agora, a incidência maior da manifestação da doença ocorre em torno da faixa etária dos 40 anos.
Tem determinadas regiões do País que a incidência da patologia pode ser numa faixa etária mais jovem, em outras pode manifestar em idades mais avançadas, mas isso não importa, o detalhe importante é criar uma rotina periódica e procurar um profissional de saúde pelo menos uma vez por ano.
Correio9 – Estamos falando muito sobre mulheres aqui, mas a gente também sabe que a doença ocorre em homens. Como é isso?
Dr. Carlos Henrique – Proporcionalmente a exposição maior ao estrogênio está na mulher, então a incidência maior está na mulher. 1% da doença que atinge as mamas é composta pelo público masculino e normalmente a faixa etária gira em torno dos 50 anos. São homens que começam a ter aumento do peso, acúmulo de gordura em volta do corpo e homens que começam a desenvolver um pouco o volume na mama pelo próprio acúmulo de gordura que vem com a idade, principalmente aquelas pessoas que estão acima do peso, pessoas que não praticam atividades físicas, pessoas que talvez tenham algum vício.
A mama masculina tendo aumento na quantidade de gordura, também tem um volume maior, porém, o fator determinante é a predisposição genética. São homens que nascem com a possibilidade de desenvolver a doença, e se chega a uma fase da vida em que eles encontram uma situação que favorece a manifestação da doença, ela acontece.
A orientação que se dá às mulheres quando elas fazem a mesma pergunta é dizer ao próprio companheiro, que ele deve tocar na mama, recomendamos que faça isso no momento de sua higiene, após o banho, na hora de se secar, criar o hábito de, com a ponta dos dedos, fazer uma apalpação em círculos em torno do mamilo para que possa sentir se a mama está em uma consistência uniforme ou se ela apresenta algum volume, ou mesmo a sensação de ter um caroço.
Infelizmente, na sua grande maioria, é difícil identificar a fase precoce no homem, e infelizmente, é muito mais agressiva a patologia da mama no homem do que na mulher. Grande maioria é descoberta tardiamente, o que agrava a manifestação e o tratamento e tem uma capacidade de agressão ao corpo infinitamente maior do que no sexo feminino. É curioso, mas poucas pessoas têm conhecimento, mas é importante relatar que isso é verdadeiro, isso aí existe. Eu mesmo tenho relatos pessoais de mulheres que já comentaram em nossa região sobre homens que já trataram, que já tiveram sérios problemas de saúde por terem desenvolvido a doença na mama.
Correio9 – O que dá origem ao câncer de mama?
Dr. Carlos Henrique – O nosso corpo é formado por milhões de células. Tudo e qualquer tecido do corpo é constituído de células. Então, na vida evolutiva, as células do nosso corpo, não importa o local – aqui nós estamos falando de mama – mas a célula nasce, ela desenvolve, amadurece e morre. Isso é um ciclo diário, evolutivo.
Quando uma pessoa desenvolve a patologia, uma célula cresce, só que naquela região começa a crescer, no mesmo lugar, duas, três, quatro células. Há uma multiplicação de células no mesmo local, onde só cabe uma. Para que essas células possam sobreviver, vai ser preciso que seja gerado um fluxo de sangue que vai desenvolver uma circulação em torno daquela região onde houve um aglomerado de células e isso vai fornecer nutrientes e alimento para aquelas células que têm uma capacidade de desenvolver a doença, normalmente ela é agressiva, se reproduzindo muito rapidamente.
Se o indivíduo que está desenvolvendo, ou a mulher que está desenvolvendo esse problema, encontra outros fatores que facilitam o avanço, essa reprodução se torna mais rápida.
Tem alguns que têm manifestação rápida, agravamento acelerado da saúde do indivíduo e tem outros que não.
Correio9 – Aqui em Nova Venécia, quais serão os procedimentos pelos quais ela vai passar? Existe um centro de diagnóstico na cidade?
Dr. Carlos Henrique – O diagnóstico é feito pelos exames de raio-x, que são os mamógrafos. Nova Venécia é um município privilegiado, nós temos três mamógrafos no município, então se a gente for analisar algumas regiões do país, existe uma incidência maior da doença nessas regiões pela dificuldade de acesso, porque nós moramos numa região onde a facilidade de circulação é boa.
Existe um dado estatístico que mostra que onde tem um número maior de mamógrafos, você tem uma facilidade maior de fazer exames, a probabilidade de identificação será maior e com certeza a constatação de existência do número maior dessa patologia será com certeza bem maior.
Em Nova Venécia nós temos a Rede Cuidar que foi o último serviço a ser montado e mantido pelo Estado, existe um consórcio de municípios e lá dentro existem alguns serviços que atendem a área de imagem. Lá são realizados exames para os moradores do entorno de Nova Venécia. Nós temos também um mamógrafo no serviço de imagem do Hospital São Marcos e outro na Clínica Salles. A gente acaba recebendo exames de todos esses locais, dando atendimento e dando orientação.
Correio9 – E como o senhor atua no tratamento? Quais são os procedimentos?
Dr. Carlos Henrique – Eu trabalho mais na parte preventiva. Eu trabalho na Secretaria Municipal de Saúde, sou lotado lá no Centro de Saúde. Lá trabalham a maioria dos especialistas pela Rede Municipal e lá eu recebo as pacientes que têm alterações nas suas mamas, são pacientes de todo o município.
A Secretaria Municipal de Saúde de Nova Venécia hoje é uma das únicas do Estado que tem uma organização, que tem uma estrutura, que tem uma capacidade para atender em várias regiões do interior e dos bairros. Têm equipes atendendo, têm profissionais e equipes capacitadas de solicitar os exames. Eu atuo solicitando esses exames, recebendo os pacientes, avaliando cada caso, solicitando novos exames complementares junto a mamografia para poder encaminhar essas pacientes com algo que necessita da avaliação do profissional que vai investigar, que é o mastologista.
A partir do momento em que há realmente a certeza do desenvolvimento da patologia, através do diagnóstico invasivo, ou seja, o mastologista analisando a imagem e suspeitando de algo, parte-se para as biópsias, onde é retirado o material da mama, encaminhado para o patologista que vai analisar esse tecido retirado da mama. Se se confirmar vai-se iniciar um protocolo de tratamento. O mastologista vai atuar antes da patologia se transformar em invasor, enquanto estiver restrito à mama.
Quanto mais cedo se descobre, mais cedo consegue a cura. Se você identifica a existência da patologia e ela está em sua fase inicial, consegue-se 100% de cura. O oncologista, que é a última etapa, atua na doença mais avançada, o protocolo de tratamento já é bastante diferenciado e a pessoa vai entrar em outro nível de atendimento que é o serviço terceirizado, que Nova Venécia não consegue e não tem condições de contemplar, pois é preciso ter hospitais maiores, com mais estrutura, alguns vão precisar passar por quimioterapia, outros por radioterapia, ou pelo tratamento hormonal.
Correio9 – O ginecologista tem como detectar a doença a partir de exames de rotina?
Dr. Carlos Henrique – É preciso analisar cada caso. Só porque houve um exame médico, ou um autoexame da paciente, não é possível dizer que aquilo ali já é uma patologia, mesmo que você está percebendo. Existem características na apalpação que o médico realiza que vai dizer se aquilo é benigno ou maligno. Mesmo que ele faça essa avaliação, vai ser preciso complementar isso com um exame de imagem porque vai dar sustentação ao raciocínio e ao diagnóstico dele. Isso vai ficar claro para o profissional e vai ficar claro também para a família e para a própria paciente.
Correio9 – Suas considerações finais.
Dr. Carlos Henrique – Olha, gostaria de agradecer ao Correio9 pela oportunidade e segundo, dizer que tenho gratidão por ter essa conversa, trocando informações, já que a vida é sempre um aprendizado, pelo menos eu penso assim. A mensagem que eu quero deixar como clínico da mulher, como ginecologista, como morador do município de Nova Venécia, como empresário – porque faço parte de uma sociedade, de uma instituição, que é a Clínica de Ultrassonografia Veneciana, que cuida basicamente da saúde da mulher – é de muita gratidão por tudo e por todos. A mensagem é que nós temos que desmistificar essa situação, é preciso incentivar as pessoas a procurarem fazer seus exames, não terem medo de fazer o autoexame, insistir quando um profissional solicitar um exame de imagem, pois grande parte das mulheres que recebem um pedido de exame, demora a realizar, demora a conseguir uma vaga. As mulheres têm que ser perseverantes, têm que ter insistência, têm que procurar outras pessoas na área da saúde pública para defender os direitos delas, mas que não cruzem os braços, que não desanimem, porque a doença não espera, ela se desenvolve rapidamente, mas nós precisamos vencer isso aí. Então a mensagem que eu quero é que as pessoas não fiquem acomodadas, saiam da sua zona de conforto.
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