Elias de Lemos (Correio9)
O deputado estadual Padre Honório foi eleito, pelo Partido dos Trabalhadores em 2014 com 29.991 votos. Honório José de Siqueira nasceu em 1957, na cidade de Mantenópolis e, até então, atuava em uma paróquia de Nova Venécia. Ele assumiu o sacerdócio há 42 anos. Neste período vem atuando em projetos da igreja, ligados à saúde, à educação e aos movimentos sociais. Atua, também, em projetos sociais da Igreja Católica desde jovem, quando foi ordenado frade na Ordem Menor dos Frades Capuchinhos.
O sacerdócio o levou ao trabalho com os movimentos sociais e, dos movimentos, para a política. Depois de eleito, ele pediu transferência para a Paróquia de Santo Antônio, na cidade de Mantena, em Minas Gerais. De acordo com ele, a decisão foi motivada para não haver conflito entre o exercício do sacerdócio e da atividade política.
O deputado Padre Honório é candidato à reeleição para um segundo mandato. Na Redação do Correio9, ele concedeu uma entrevista na qual fez um balanço do seu mandato e falou da continuidade dos projetos que desenvolveu até aqui. Confira abaixo:
Correio9 – Deputado, como está sendo a sua segunda campanha? Como os eleitores tem lhe recebido?
PADRE HONÓRIO – A primeira campanha que nós fizemos foi uma campanha mais localizada aqui no Noroeste do Estado, mais especificamente em Nova Venécia.
Com o projeto Interagir Para Construir, o mandato foi se expandindo. Dentro daqueles programas, das políticas públicas e até mesmo da essência do projeto, vários municípios nos procuraram com a intenção de adotarem as nossas ações. Então hoje, nós estamos trabalhando em mais de 50 municípios e a receptividade está sendo muito boa porque eu não alterei o meu ritmo de trabalho.
Se antes da campanha trabalhava fazendo reuniões, ouvindo as pessoas, construindo com as pessoas, o ritmo continuou o mesmo. Eu não tenho muito tempo, às vezes, de ficar andando na rua porque eu tenho agenda o dia inteiro com grupos. Eu prefiro sentar com grupo de 30, 40, 50 pessoas, e ouvir o que elas têm a me dizer. Elas fazem as suas críticas, elas fazem as suas reivindicações, e aí, num processo de interação, a gente vai fazendo os encaminhamentos necessários.
Correio9 – Então, podemos entender que a sua proposta para o segundo mandato é a sequência do primeiro?
PADRE HONÓRIO – Na realidade eu sempre trabalhei com essa máxima: todo projeto tem que ter início, meio e continuidade. Então, o projeto é o mesmo, ele é estruturado em 12 eixos: meio ambiente, agricultura, sustentabilidade, infraestrutura, segurança pública, esporte, cultura, lazer, saúde e educação, associativismo, formação política, agroecologia, e a visão social, que seria assistência social. Então, este projeto tem construído os arranjos produtivos. Hoje nós estamos com mais de 270 arranjos produtivos caminhando.
Então, mesmo que eu quisesse interromper para recomeçar outra coisa, eu não poderia. Eu tenho que dar continuidade àquilo que está dando certo. Se no começo eram 20 municípios e, agora, são 50, significa que o projeto está sendo aprovado, e que as pessoas estão querendo escutar o deputado. Construir com o deputado. Outros municípios estão me procurando e eu não tive tempo ainda de cumprir toda a agenda, de atender todas aquelas iniciativas que nos procuram.
Correio9 – O senhor foi uma das primeiras pessoas a iniciar um movimento de trabalho para retirada de jovens do mundo das drogas, aqui em Nova Venécia. No entanto, o seu movimento é isolado, e outras iniciativas são incipientes. Deputado, o que mais pode ser feito para enfrentar este problema?
PADRE HONÓRIO – Existem as políticas de prevenção, não apenas na questão das drogas. Os governos investem muito em construção de hospitais, na compra de ambulâncias, na construção de postos de saúde. Mas investem muito pouco na prevenção, até porque, se você fizer um levantamento no estado do Espírito Santo, são pouquíssimos os municípios que têm saneamento básico.
Nós estamos neste momento entendendo que as pessoas têm muita dificuldade em trabalhar na prevenção, e quando se trata das drogas, a gente percebe que o povo quer presídio, penitenciária e polícia. Mas, às vezes, o que faz um jovem, o que faz um adolescente entrar no mundo das drogas é a falta de oportunidades, então, para mim, a política mais eficiente é a preventiva.
São as políticas públicas de esporte, cultura e lazer que têm que estar ali nas cidades, nos bairros, na roça. São as políticas públicas de prevenção na saúde, são as oportunidades que devem ser dadas a essa juventude, que muitas vezes sai da faculdade e fica perambulando por aí sem saber o que fazer e como fazer. Eu vejo que a melhor maneira que nós temos para trabalhar essas políticas é trabalhando a importância da família, a importância das instituições organizadas. Nós não nascemos para vivermos isolados uns dos outros, nós nascemos para conviver coletivamente.
Muitas vezes, o poder público leva para um bairro uma academia, mas não vai a política pública. Muitas vezes, leva uma quadra de esportes, mas não vai a política pública. Então, a sociedade revoltada, acabou quebrando aquele equipamento. É como se dissessem: nós não queremos presentes, nós queremos a presença.
Correio9 – Aqui no Espírito Santo há um amplo debate sobre a questão do sistema prisional. Superlotação e problemas internos de assistência aos presos. Sendo eleito, o que o senhor poderia propor para mudar esse sistema prisional?
PADRE HONÓRIO – Olha, a primeira questão é o seguinte: nós, em 2005 mais ou menos, tínhamos 5.000 presos. Nós estamos em 2018 e nós temos 20.000 presos. Olhe este aumento, então, tem alguma coisa errada neste caminho. Eu já sentei diversas vezes com o secretário da SEJUS (Secretaria de Justiça e Cidadania); já sentei com o secretário de Direitos Humanos; já sentei diversas vezes com o Governo falando da necessidade de trabalharmos um projeto que seja mais eficiente e eficaz.
Por exemplo, nós temos uma comunidade de presos que fica lá na ociosidade, muitas vezes, aprendendo o que não deveria aprender. Uma coisa é um traficante que já está no clima há muito tempo, que é violento. A outra coisa é um jovem que cometeu o seu primeiro delito. Mas ele é colocado no mesmo espaço daquele que já é profissional do crime, então ali, ou ele se adapta, ou ele é eliminado.
A primeira coisa a se fazer é ter um tratamento diferenciado dentro dos presídios. Presos que são mais perigosos, ou que são mais articulados com o crime, deveriam estar separados destes que cometem os seus primeiros delitos, de uma maneira, a trabalhar políticas de reabilitação com esses indivíduos. Nós tivemos uma proposta, eu cheguei a fazer essa proposta para a SEJUS e também, para o Governo. Por que não criar uma faculdade à distância para estes presos que estão em recuperação? Ora, a faculdade à distância não exige a presença 100% do aluno, então ele vai poder ter o espaço dele e fazer os seus trabalhos, desenvolver as suas atividades.
Seria uma maneira de as pessoas irem trabalhando os seus intelectos em vez de ficarem na ociosidade pensando besteira, e assim, começariam a pensar em coisas positivas. Do mesmo jeito, eu acompanho projetos em alguns presídios onde a comunidade está oferecendo, como tem em São Mateus, o Semeando Liberdade. A comunidade oferece aos detentos a oportunidade de trabalhar, e com o seu trabalho, também, custear um pouco as suas despesas e também, ajudar suas famílias. Ora, no projeto Semeando a Liberdade, praticamente 100% não voltaram ao crime, foram reabilitados. Então, tem muitas oportunidades de políticas públicas concretas.
E tem aí o programa do Governo do Estado chamado Ocupação Social, que é um programa bom, mas ainda é muito tímido. Tem outros programas do governo e também todos os tratamentos que existem. Agora, se não trabalhar a raiz do problema nós vamos ter, a cada dia, mais necessidade de fazer mais presídios, porque a nossa sociedade, a cada dia que passa, está mais violenta.
Há alguns anos, quando você saía de casa, você ia à porta, pegava uma cordinha, fechava a porta, amarrava e saía. A única preocupação era não entrar algum animal dentro de casa. Hoje, você coloca tranca, você coloca grade, você coloca câmera, você coloca alarme, você coloca tudo, e mesmo assim não tem segurança. Quando você andava pelas estradas você levava um ‘porretinho’ pelo medo de encontrar algum cachorro, ou algum boi bravo ou alguma cobra. Hoje, você tem medo de encontrar alguma pessoa. Você vai na cidade depois das 22h, você vai na rua, você tem medo de encontrar alguém. Você vai na roça, você tem medo de encontrar gente. Então o que está faltando? Pode fazer o máximo de presídio, pode colocar lá dentro o máximo de segurança, você pode fazer tudo, que, mesmo assim, você não vai estar diretamente trabalhando a origem do problema.
Tem que ter programas lá dentro? Tem! Mas nós precisamos trabalhar para evitar que o ser humano vá parar lá. Por quê? A maioria de lá são jovens, mais de 70% são jovens. E da maioria desses jovens, praticamente 99% são dos bairros mais periféricos. É como se talvez, a sociedade pudesse entender: é só lá na periferia que tem drogas? Não, aqui no centro está cheio de gente usando droga. É só lá que tem criminoso? Não.
Agora, como é a relação social lá? Como é que é a relação social aqui? Eu tenho sempre nas minhas oportunidades – como presidente da Comissão da Política Sobre Drogas e como vice-presidente da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos – trabalhado muito essa questão e tenho sugerido muitas ideias. É uma questão que não deve ser feita assim como num toque de mágica.
Correio9 – A gente vive na prática uma questão de divisão social como o senhor mencionou aí. Você tem periferia e você tem as regiões mais privilegiadas. Existe o muro que separa essas duas coisas e parece que isso é intransponível.
PADRE HONÓRIO – Olha só, o próprio sistema de governo coloca esse muro. Ali em Vitória, nós temos a praia de Camburi, que, de manhã, de tarde, de noite, de madrugada tem as oportunidades de esporte, cultura e lazer. Além da praia, tem as quadras. Você anda há 100 m e você estará em Jardim da Penha. Lá, a cada 100 m você encontra uma praça com quadra de esportes, com pistas de corrida e etc.
Então, aquelas famílias têm muitas oportunidades de lazer, de convivência. Se você anda poucos quilômetros, você chega ao Planalto Serrano, chegando lá em Nova Rosa da Penha, você não encontra absolutamente espaço nenhum para os jovens, para as crianças, para os adolescentes, para as famílias se divertirem ou conviverem juntas.
E aí? Como é que vai fazer isto? Para aquela família lá de Santa Rosa da Penha vir para o centro precisa de pagar uma passagem, e muitas vezes tem que passar por perigos. Então, este muro invisível vai se tornando visível nas práticas políticas. Você chega no centro de Vitória, você tem uma realidade, se você andar 100 m, você sobe no Morro da Piedade, onde você encontra outra realidade. E não é a realidade porque o povo de lá não é bom. A realidade lá é porque lá não tem as oportunidades que cá em baixo tem.
Aqui em Nova Venécia, você vem ali perto do ginásio de esportes no Beira Rio. Quantas áreas de esportes tem ali? Você vem para o lado de cá, tem uma praça ali, você vai do lado de lá tem outra praça ali. Agora vá lá ao Bairro Altoé. O que é que tem lá de políticas públicas para os jovens, para aqueles adolescentes?
Vá ao Bairro Alvorada, lá no Buraco do Sapo para ver o que tem lá! Então, você vai vendo que a própria situação social é imposta pelo poder público. Para mim, na minha maneira de entender, o poder público deveria começar de lá para cá.
“Ah, o que nós podemos fazer para esses meninos terem oportunidades, para que possam ter atividades, para que sejam acompanhados?” Experimenta sair no sábado, ou num domingo e faz uma visita nos bairros mais periféricos para ver o que você encontra de políticas públicas lá. Então, este muro que separa, ou que impõe uma condição é imposto pelo próprio sistema de gestão que não leva em consideração as pessoas.
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