Elias de Lemos (Correio9)
Na semana que seguiu o primeiro turno das eleições de 2022, escrevi (neste espaço) sobre as limitações impostas pelo cenário atual ao, então, futuro governo.
Na ocasião, mencionei o peso da Dívida Pública que impõe ao governo dispêndios astronômicos para o pagamento de juros da dívida; a falta de recursos para os investimentos prometidos durante a campanha e a dificuldade para construção de uma base de sustentação no Congresso Nacional, uma vez que a oposição saiu – da eleição – maior do que a base aliada ao governo.
Agora, com quatro meses e meio no cargo, o presidente tem se decepcionado com as dificuldades de governabilidade e gestão, encontradas no exercício de seu terceiro mandato.
Os dois primeiros mandatos do petista (2003-2006 e 2007-2010) tiveram a marca da popularidade do presidente, calcada na implantação de programas que proporcionaram avanços sociais que impactaram positivamente, especialmente a vida dos mais pobres.
É importante ressaltar a diferença de cenários. Em 2003, Lula recebeu um governo organizado; sem discutir méritos, seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, foi um presidente responsável. Ao assumir, o caminho do governo Lula estava pronto, bastava pavimentar. E foi isso o que ele fez.
No entanto, o cenário de 2023 é outro! Agora, ele pegou um governo institucionalmente desarranjado e aparelhado para o atendimento a interesses particulares. Soma-se a isso a crise econômica e social, além de inúmeros outros pontos de fratura produzidos durante os quatro anos em que o Brasil conseguiu sobreviver ao desastre chamado Bolsonaro.
Como se não bastasse o “presente de grego” recebido pelo governo atual, vale destacar que de 2003 para cá, Lula enfrentou um desgaste de sua imagem com a ascendência do antipetismo causada pela crise no Partido dos Trabalhadores (PT), motivada pela Operação Lava Jato que corroeu a imagem da sigla. Ele foi julgado, preso, humilhado e execrado publicamente.
Com quase cinco meses de governo, o presidente tem enfrentado dificuldades para aprovar projetos – como é o caso das mudanças propostas para o novo marco de saneamento e a PL das fake news.
Além disso, o governo precisa aprovar o arcabouço fiscal, que busca a criação de novas regras fiscais em substituição ao teto de gastos, aprovado no governo do ex-presidente, Michel Temer (MDB), ao mesmo tempo em que trabalha para melhorar a sua relação com o Congresso.
Neste terceiro mandato, Lula se encontra em uma encruzilhada, com problemas que parecem ter sido mal avaliados e subestimados antes do início do governo: ele tem pretensões maiores do que nos mandatos anteriores, mas paradoxalmente, não pretende fazer tantas concessões, como antes, para conseguir governabilidade. Isso lembra algo não muito distante: antes de ser eleito, Jair Bolsonaro falava que em seu governo não teria a “velha política”, mas foi engolido por ela e o resultado foi o “orçamento secreto”, considerado um dos maiores esquemas de corrupção do mundo.
Como se não bastasse tudo isso, Lula vem derrapando na construção de uma base de apoio que não ata nem desata e, junto a isso, enfrenta uma oposição que se esmera em atrapalhar o governo desde que o novo Congresso foi empossado em fevereiro.
E a situação política na esfera federal não permite otimismo nesses quatro anos que se iniciaram em janeiro. Além do combate odioso da oposição, Lula enfrenta o rancor dos que estiveram na Presidência até o ano passado e foram defenestrados na eleição.
Oposição é importante e faz parte do jogo democrático, porém, a democracia é feita de diálogo – incluindo o debate entre vencedores e vencidos. Mas, não é isso que estamos vendo! E sim, uma defesa tresloucada de interesses oposicionistas, sem nenhuma, nenhuma preocupação com o País. É importante destacar que há civilidade e racionalidade em alguns (poucos) integrantes da direita, mas não se trata da maioria. O que prepondera é a proteção do terreno mantido e a busca de recuperar a presidência perdida. Enquanto isso, o País não vai e nem vem.
Para completar, o presidente tem atirado para todos os lados, sem um alvo definido, mas seus tiros podem ricochetear e atingi-lo diretamente. Ele tem mirado alvos que podem gerar graves crises e – isso acontecendo – a ‘batata quente” vai cair em suas mãos. É o caso da sua vontade de reestatizar a Eletrobras, que geraria forte insegurança jurídica no País.
No entanto, mais grave é a queda de braço travada por ele com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que está sendo pressionado pelo governo e sua horda de aliados para baixar a taxa de juros a qualquer custo, o que – no curto prazo – poderia resultar em um movimento positivo na geração de emprego; que passaria logo sendo seguido por uma escalada inflacionária.
O governo mal começou, mas Lula tem problemas para os próximos quatro anos. Pior que isso: ele parece não saber qual caminho deve seguir.
* O autor é economista, professor, jornalista, escritor e editor-chefe do Correio9
OS TEXTOS ASSINADOS NÃO REFLETEM, NECESSARIAMENTE, A OPINIÃO DO CORREIO9
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