Elias de Lemos (Correio9)
Notícias falsas, informações erradas, enganação, calúnia, injúria, difamação… Entre textos, imagens e vídeos, a circulação de mentiras se tornou comum.
O termo fake news começou a ser usado no final do século XIX, porém, foi popularizado internacionalmente, pela imprensa, quando começou a usá-lo com frequência durante a eleição americana de 2016. No Brasil, o termo entrou no vocabulário popular no decurso da campanha eleitoral da eleição de 2018, com raízes em interesses eleitorais.
O fenômeno das fake news foi favorecido com a democratização da internet e o vasto uso das redes sociais, que mudaram as formas de se acessar e de se dar as notícias. Porém, muitas vezes são informações falsas ou boatos para confundir e enganar quem recebe esse tipo de mensagem.
Atualmente, por exemplo, uma das mentiras que mais tem circulado dá conta de que os hospitais recebem uma contrapartida financeira por cada morte por Covid-19. E parece que há até uma tabela diferente de preços. Já recebi vídeo afirmando que o valor pago aos hospitais é de R$ 5 mil; outro diz que é R$ 8 mil; R$ 16 mil e R$ 19 mil. Porém, nenhum deles informa a origem da informação, quem paga, de onde sai o suposto dinheiro, nem a que ele se destina.
O jornalista e servidor da Câmara Federal Cláudio Guimarães Lessa publicou, no Facebook, mensagens falsas contra o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), e sua família. Ele divulgou, sem nenhuma base, que durante o tratamento contra o novo coronavírus, o governador e sua esposa, dona Maria Virgínia, estavam fazendo uso do medicamento “hidroxicloroquina”. Porém, era mentira!
O deputado estadual Lucínio Castelo de Assumção, também conhecido como “Capitão Assumção”, e o ex-deputado federal e empresário Carlos Humberto Manato embarcaram na fake news de Cláudio Lessa para atingir o governador.
Os ataques não ficaram restritos ao chefe do Executivo capixaba. Além disso, divulgaram ofensas acusando aos governadores dos Estados, de modo geral, desvio de dinheiro da saúde e descaso para com a população, tendo utilizado termos chulos, tais como “politicagem safada dos governadores ladrões”, conforme postagem nas redes sociais.
Quem produz notícias falsas não tem responsabilidade com a verdade, tem apego à falsidade, a maledicência e chega a “brincar” com a saúde e a vida alheias. Uma lista com indicação de medicamentos para tratar a Covid-19, doença causada pela pandemia do novo coronavírus, viralizou nas redes sociais. O conteúdo, supostamente atestado por médicos capixabas, é fake news, o desmentido foi feito pelo mesmo grupo de profissionais a quem é atribuída a recomendação.
A mensagem contém indicação das fases da infecção pelo vírus, assim como os remédios que devem ser prescritos em cada uma delas. Mas, o grupo de médicos afirma que o conteúdo da mensagem é falso.
Quando o governador autorizou a abertura das lojas de chocolate na Páscoa, os falsários transitaram da maldade à tolice: foi divulgado que ele só fizera isso para beneficiar uma filha que possui uma loja. Mentira!
Recentemente, também, o governador foi vítima de outra fake news: a de que estava em uma festa junina onde havia muita aglomeração. No entanto, o vídeo é de 2017, e nada tem a ver com o momento atual da pandemia do novo coronavirus.
Aliás, a Superintendência Estadual de Comunicação (Secom), tem se esmerado para esclarecer a quantidade de mentiras que têm sido inventadas contra o Governo, assim como, a Procuradoria Geral do Estado tem sido levada a perder tempo com as medidas jurídicas necessárias para cada caso. Em todas, o governador venceu na Justiça.
Apesar da dimensão do problema e da relativa facilidade de se encontrar os grandes disseminadores de notícias falsas, entretanto, a solução não é tão fácil, pois qualquer medida para coibi-las poderia afetar um direito fundamental em muitas sociedades, que é o da liberdade de expressão. É justamente nesse ponto que os falsários se apoiam para justificarem suas atitudes: “a liberdade de expressão”.
Curiosamente, muitos que compartilham notícias falsas o fazem mesmo cientes disso. E mais, essa mesma “liberdade” é usada para tentar viabilizar, tanto interesses políticos, quanto econômicos. Em nome da liberdade de expressão, tem veículos de comunicação produzindo textos e artigos, inteiramente falsos, atacando o Governo e a atuação da superintendente estadual de comunicação, Flávia Mignoni.
Há alguns dias, em um jornal capixaba, li um editorial que não tem começo, nem meio, tampouco fim. O texto é um exemplo de como não se deve fazer jornalismo. No entanto, nas entrelinhas do artigo, fica evidenciada a intenção do autor, que claramente não é o interesse público. Ele demonstra descontentamento com a política de publicidade implantada na Secom a partir de 2019.
Ao mesmo tempo em que as redes sociais se impõem com um oceano de informações, muitas das quais deturpadas, para não dizer inventadas, a ação jornalística se torna fundamental para, não só informar, mas investigar e esclarecer o que é fato e o que é fake.
Na semana passada circulou, em Nova Venécia, a informação de que havia um grupo de pessoas se passando por agentes de saúde para entrar nas casas das pessoas. Elas estariam usando o que foi chamado de “golpe do coronavírus”. Recebi um vídeo em que um rapaz filmou duas viaturas abordando duas pessoas no Bairro Santa Luzia. O rapaz afirmou: “Estou passando aqui no Santa Luzia no momento em que a Polícia está prendendo os golpistas”.
Imediatamente entrei em contato com a assessoria de imprensa do 2º Batalhão da Polícia Militar, a qual responde prontamente: “Não é isso não; a Polícia recebeu uma denúncia e foi averiguar, mas são os funcionários da empresa que está fazendo o georreferenciamento, eles estão trabalhando”. Mas o vídeo já havia “ganhado o mundo”.
Em tempos de redes sociais, da pequena à grande mídia, o trabalho da nossa categoria tem sido muito desrespeitado. Pelo menos três razões contribuem para isso: 1) as redes sociais deram voz a todos; 2) o Brasil está dividido ideologicamente; e 3) o analfabetismo funcional impera no país.
Ao dar voz a todos, cada um fala o que quer. A ideologia leva cada um a acreditar no que lhe convém (como homens e mulheres traídos, que preferem não saber a verdade) e muitos diplomados frequentaram a universidade, conquistaram profissões, mas não se desenvolveram intelectualmente, se acham sábios e inteligentes, mas se alimentam de opiniões infundadas. Diploma não é sinônimo de conhecimento, nem de sabedoria. Tem muito doutor analfabeto e muito analfabeto doutor.
Analfabetos funcionais são aqueles que aprenderam a ler e a escrever, mas, a falta de exercício contínuo os devolveu à condição anterior. Somos um país que não gosta de ler! No entanto, somos um povo que gosta de opinar sobre tudo.
Ler é o primeiro passo para aprender a pensar. Pensar leva a fazer escolhas. Pensar errado leva a escolhas erráticas. No, entanto, no Brasil, o mais perigoso é a predileção pelo autoengano. Na verdade, a verdade foi dita por George Orwel: “Quanto mais a sociedade se distancia da verdade, mais ela odeia aqueles que a revelam”.
* O autor é economista, professor, jornalista, escritor e editor-chefe do Correio9
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