Elias de Lemos
O ano de 2020 está sendo daqueles que gostaríamos que não existisse. Vivemos dias difíceis e angustiantes que têm deixado o nosso futuro incerto. No entanto, se olharmos para traz, constataremos que de tempos em tempos, a vida dá um sacolejo na humanidade. Ainda não tínhamos enfrentado um desses sacolejos. Portanto, não estávamos preparados para ele. Justamente nós, que sempre gostamos de ter explicação para tudo.
Justamente nós que gostamos de ter tudo agendado, estamos vivendo “um dia de cada vez”.
Nessas ocasiões, cada um age ao seu modo. Alguns com calma, outros com desdém, têm os que se desesperam e os que têm fé que a vida vai voltar ao normal, que tudo isso vai passar e que dias melhores virão.
A história (a mesma que muitos são contra nesses dias insanos que o Brasil vive) nos ensina que a humanidade já passou por “poucas e boas”. As pestes, guerras, tragédias climáticas e tantas outras sacudidas que ficaram para traz, nos dão o alento de que é possível ter esperança.
O que é um ser humano sem esperança? Por isso precisamos de nos apegar a ela!
A esperança equivale à expectativa de felicidade, de bem-estar, de tranquilidade na vida de cada ser humano. E é importante refletir sobre o antônimo dessa palavra, que é o desespero, ou a perda definitiva da esperança. Quem perde a esperança, perde o sentido da vida, não há sentido em viver sem esperança e é contra isso que estamos combatendo.
A esperança é o antídoto contra a depressão, é a vacina contra o desânimo e a prostração. Ela é contra o egoísmo porque abre-nos a possibilidade de dedicarmos à construção de um mundo melhor, para mim, para você e todo mundo (Heal The World, Michael Jackson).
Quando a perdemos, nossos sentimentos ficam recrudescidos e nossas almas se recolhem; a vida perde a coloração e se acinzenta ficando sem sabor.
Porém, todos os dias somos atingidos por inúmeras situações que podem nos desesperar; como a que estamos vivendo agora.
A esperança é a fórmula do bem-viver; é o combustível da vida, que nos proporciona uma boa noite de sono, que nos faz levantar todos os dias, que nos faz voltar alegres para casa depois de um dia de trabalho.
A melhor forma de mantê-la acesa é diversificar o foco, sem prender os olhos nas tragédias, que nos são tão comuns ao longo da existência. A forma de viver bem e termos uma vida feliz, é termos a consciência de que a felicidade não é um ponto: é um caminho. E como todo caminho, é feita de curvas e retas; de subidas e descidas e têm buracos e pedras no trajeto.
Precisamos, pois ter a consciência de que a cada desgraça que contemplamos corremos o risco de perder o combustível.
Na mitologia grega existe uma figura interessante: uma ave chamada fênix, que quando morria entrava em autocombustão e, passado algum tempo, renascia das próprias cinzas, se renovando sempre.
A fênix é o mais fabuloso de todos os animais lendários. Ela simbolizava a esperança e a continuidade da vida após a morte. Revestida de penas vermelhas e douradas, as cores do sol nascente, possuía uma voz harmoniosa que se tornava triste quando a morte se aproximava. No entanto, não era possível dizer que era tristeza. Talvez, fosse resignação.
Resignação! Neste momento, precisamos muito disso, para atravessar esta curva da vida; para resistir a este sacolejo, para renascermos melhores.
Nossas vidas passam por este processo várias vezes. Pode ser hoje, amanhã, depois de amanhã ou no ano que vem. Pode ser num único dia. Em outras palavras, saímos das tragédias para contemplar a beleza que não morreu, a vida que, ainda, existe, exatamente como fazia essa ave mitológica, admirável e inspiradora de esperança.
Alguns estudiosos da mitologia grega acreditam que o que trazia a fênix de volta à vida seria somente, unicamente, o seu desejo de continuar viva, e depois de completar quinhentos anos ela perdia o desejo de viver; depois disso, ao morrer, não voltava mais à vida. O desejo de continuar a viver, se renovando sempre, era sua paixão pela beleza que é a vida.
Para quem perdeu a capacidade de sonhar, o desejo de viver e ter uma vida feliz se tornou uma utopia e a vida se transformou em um fardo difícil de carregar. Uma vida sem esperança é uma vida apagada, sem perspectiva para o novo amanhecer.
Para quem cansou de tentar, cansou de lutar e desistiu de tudo, a vida não é nada mais nada menos do que a espera do seu fim.
Quem perdeu o combustível vive a pensar que nada que se faça pode mudar coisa alguma.
A verdadeira esperança é uma atitude autêntica e realista, que não tem medo de dar às situações o seu verdadeiro nome, que não tem medo do enfrentamento de cada obstáculo que aparece e tem sempre a resignação como fator principal. Para muitos, esta esperança é encontrada na fé em Deus. Para pais e mães, na beleza que encontram em verem os filhos crescendo.
À medida que perdermos nossas ilusões e incompreensões temos o espaço real no qual pode crescer a esperança, que nada mais é do que a certeza de que tudo pode ser melhor do que o que já vivemos. E encontramos o desejo de caminhar pela estrada da vida, atraídos pela sua beleza que no momento pode ser, apenas, sonhada, mas é contemplada pelo coração e pela perspectiva de dias mais coloridos.
A raça humana pode ser resistente às palavras, forte nas argumentações, mas não sobrevive sem esperança. Ninguém vive se não espera por algo bom, que seja bem melhor do que o que já é conhecido, já possuiu ou já experimentou.
Se tudo que acontece tem um sentido, se nada é por acaso, por que estamos passando por esse enfrentamento? O que a vida está querendo nos ensinar? Até que ponto vivemos o nosso egoísmo sem pensar na situação do outro?
Percebemos nestes meses, que para nos proteger do vírus, da doença, precisamos preservar a saúde alheia. Já pensou nisso? Percebemos, também, que quanto maior a quantidade de notificações e de mortes, ficamos mais vulneráveis e nos damos conta de que não temos a supremacia da eternidade. Que, em razão disso, precisamos viver o agora. Que a felicidade não está lá na frente, mas, é vivida a cada dia que se passa e chega a cada dia que amanhece.
Nossa vida é alimentada e impulsionada pela esperança! É ela que nos faz percorrer a estrada da vida!
* O autor é economista, professor, jornalista, escritor e editor-chefe do Correio9
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