Marcos Costa Leite
Hoje vou falar sobre quanto vale a obra de arte mais famosa de todos os tempos. Precificar um quadro já é algo particularmente complicado, pois existem muitas variáveis intangíveis, não quantificáveis. Cada pessoa pode atribuir um valor diferente a certas características que dependem de gosto. Ainda contam outros aspectos de mercado como raridade, se o artista está morto ou até estado de conservação. Dado que existem várias maneiras diferentes de dar preços a objetos, acho que a melhor forma de analisar a Mona Lisa é ver uma a uma qual faz mais sentido.
A forma mais básica de precificar qualquer coisa é pelo valor do material. Seja só a matéria-prima ou ela somada ao valor do trabalho da pessoa que fez aquilo. Uma barra de ouro vale seu peso vezes o preço do grama do ouro, simples assim. Obras de arte normalmente não têm seus preços atribuídos dessa forma porque fazer arte é agregar valor intelectual sobre um material qualquer. Isso me faz lembrar da obra For the Love of God, de Damien Hirst; uma caveira cravejada com 8.601 diamantes, com custo de produção de 14 milhões de libras. Ele jura que revendeu para um “grupo anônimo de colecionadores” por 50 milhões mas ninguém acredita muito nessa história. De qualquer forma, continua sendo um bom exemplo de como mesmo com um alto custo de produção, o trabalho do artista agrega um valor intangível. Voltando à Mona Lisa, se fôssemos apenas avaliar o material dela, um paninho pintado com meio milênio de idade, seu valor seria praticamente zero.
A segunda forma mais comum de precificação é ver o quanto custa para restituir em caso de destruição ou sumiço. É como a maioria das seguradoras atribui o valor de suas franquias. Aquele casaco que você esqueceu no quarto do hotel custa o preço de um novo para ser substituído, uma vez que não existe um mercado paralelo de casacos usados, mas um carro com 5 anos de uso não custa a mesma coisa que um zero km. Esse tipo de análise é particularmente difícil no caso de obras de arte, uma vez que em sua maioria elas são únicas e de artistas já mortos. Mas ok, não precisa ser exatamente a mesma coisa. Podemos encontrar um preço aproximado usando obras bem parecidas do mesmo artista. A última obra de Leonardo da Vinci a ser transacionada, Salvator Mundi, foi vendida ano retrasado por 127 milhões de dólares. Suas dimensões eram bem semelhantes às da Mona Lisa e sua qualidade artística inquestionável, mas não chega a ser parecida o suficiente para usarmos como referência.
Finalmente chegamos à forma mais “justa” de atribuir o seu possível valor: preço de mercado. Ou seja, se o Louvre colocar a Gioconda (popular Mona Lisa) à venda, quanto seria oferecido por ela. Não adianta dizer que vale milhões se ninguém concorda ou está disposto a pagar. Só tem um problema: ela não está à venda, nem poderia. O quadro é um patrimônio cultural francês e tentar vendê-la seria a mesma coisa que tentar vender a Torre Eiffel. A obra é considerada um “tesouro nacional”, título que demanda autorização para que seja vendida para fora do país, mesmo proveniente de coleções privadas. No caso de obras de arte, se o dono receber uma oferta e quiser vender, ele tem que avisar o ministério da cultura. Um comitê então avalia se vale a pena comprar a obra e, caso positivo, o governo tem 30 meses para levantar o valor que havia sido oferecido ao vendedor. Só que o presidente desse comitê é…. o diretor do Louvre! Como o diretor do museu poderia pensar em aceitar uma proposta sendo que ele mesmo é o chefe de um comitê que tem como objetivo proteger o patrimônio cultural francês?
“Ah Marcos, mas você me fez ler esse texto todo pra dizer que ela não tem preço?” Basicamente sim, mas a maioria dos especialistas diria que, caso posta à venda, a conversa começaria em pelo menos um bilhão de dólares. Para se ter uma ideia, a obra de arte mais cara de todos os tempos foi Os Jogadores de Cartas de Cézanne, vendida por 250 milhões de dólares em 2011. Existe uma outra versão do quadro no Museu d’Orsay que, de acordo com nosso segundo critério de avaliação, teria um preço semelhante. Se um quadro que não é nem um dos 5 mais importantes de Orsay vale isso, imagina o mais importante do mundo? A resposta é simples: incalculável.
Apêndice bônus
Na verdade existe uma forma bem financeira e utilitarista de atribuir valor à Mona Lisa. Foi a melhor forma que eu consegui pensar caso eu fosse “obrigado” a dar essa resposta. Coloquei como apêndice porque é realmente uma viagem e envolve umas contas chatinhas, mas achei curioso compartilhar. O preço do quadro poderia ser estimado levando em consideração quanto de dinheiro ele gera para o Louvre todo ano. O museu recebeu em média 8.5 milhões de visitantes pelos últimos 10 anos. Em uma entrevista ao New York Times em 2009, o então diretor do museu estimou que 80% das pessoas que vão lá estão apenas interessados na Gioconda, embora também acabem vendo outras obras de tabela. Com o ingresso a 15 euros, o quadro gera 102 milhões de euros por ano em visitas. Considerando todas as variáveis constantes e uma taxa de juros de 1% ao ano na França pra sempre, o valor presente da perpetuidade seria de 10.2 bilhões. Tirando uns cacarecos pra manutenção e conservação, chegamos finalmente à resposta: A Mona Lisa vale 10 bilhões de euros. Algum interessado?
O roubo que a lançou à fama
Olivia Sorrel-Dejerin
Mais de um século completa-se desde que a Mona Lisa, de Leonardo Da Vinci, voltou a seu lugar no Museu do Louvre em Paris, depois de uma ausência de dois anos. O roubo da obra-prima italiana solidificou seu status como a pintura mais famosa do mundo.
No entanto, o homem que a roubou, Vincenzo Peruggia, não era o ladrão engenhoso que aparece em tantos filmes de Hollywood.
Ele conseguiu entrar no Louvre e sair com a pintura de Da Vinci com o mínimo de preparação, mas o feito causou sensação e criou um ícone.
O roubo aconteceu em uma segunda-feira, no dia 21 de agosto de 1911, um dia em que o museu estava fechado.
A ausência do quadro só foi notada na terça-feira. A polícia começou uma investigação e o centro permaneceu fechado durante uma semana em meio ao escândalo.
“La Joconde” (A Gioconda) – como os franceses chamam a Mona Lisa – desapareceu por mais de dois anos e foi recuperada em 10 de dezembro de 1913, quando Peruggia foi capturado ao entregar a obra a Alfredo Geri, um vendedor de antiguidades de Florença, na Itália.
Segundo o historiador da arte americano Noah Charney, autor do livro Os roubos da Mona Lisa, este foi o primeiro delito contra a propriedade a receber a atenção da mídia internacional.
É fácil assumir que o incidente causou tal sensação porque a Mona Lisa era “a pintura mais famosa do mundo”, mas naquele momento, ela não era. O que realmente a catapultou para a fama foi o roubo.
A cobertura midiática que ela teve durante o tempo em que esteve perdida foi o principal motivo de sua fama mundial. Antes disso, muita gente nunca a tinha visto.
“A imagem começou a aparecer em noticiários cinematográficos, caixas de chocolate, postais e anúncios publicitários. De repente, ela se transformou em uma celebridade como estrelas de cinema e cantores”, escreveu o escritor britânico Darian Leader, autor do livro Roubando a Mona Lisa: o que a arte não nos deixa ver.
Multidões passaram a ir ao Louvre só para ver o espaço vazio onde o pequeno retrato da mulher do século 16 costumava estar.
Antes disso, o Louvre já tinha muitas obras de destaque, como a estátua Vênus de Milo, a pintura “Liberdade Guiando o Povo”, de Eugène Delacroix, e o quadro “A balsa de Medusa”, de Théodore Géricault. Mas após o roubo, a Mona Lisa conquistou uma fama única.
O furto tornou-se assunto de Estado e despertou discussões apaixonadas na mídia francesa.
Segundo o jornalista francês Jerome Coignard, autor do livro Uma mulher desaparece, uma vez que os jornais franceses descreveram as circunstâncias do roubo, não tinham mais o que dizer. Por isso, começaram a inventar histórias sobre o quadro, como a de que Leonardo Da Vinci teria se apaixonado pela modelo.
A polícia seguiu muitas pistas sem sucesso. O poeta vanguardista Guillaume Apollinaire chegou a ser preso por uma semana e seu amigo, o pintor espanhol Pablo Picasso, também foi suspeito do roubo. Ambos eram inocentes.
Apesar da fama, a verdade é que o ato aparentemente espetacular do ladrão não necessitou de nenhum plano grandioso.
O museu tinha um sistema de segurança duvidoso e poucos guardas. De fato, o trabalho que se fazia para melhorar a má segurança das obras foi o que inspirou Peruggia.
O italiano havia trabalhado no Louvre em 1910 e instalado pessoalmente a porta de vidro que protegia a obra-prima. Ele ainda tinha o uniforme branco que os empregados do museu usavam e sabia como a pintura estava presa.
“Todos estes conhecimentos se juntaram quando ele teve uma oportunidade”, diz Charney.
Após sua captura, Peruggia alegou que sua motivação era patriótica – ele teria pensado que Napoleão havia roubado a pintura da Itália e que sua missão era levá-la de volta para casa.
Ele estava enganado. O quadro havia sido comprado pelo rei francês Francisco 1º no século 16, por uma quantia considerável de dinheiro.
Como imigrante italiano, Peruggia também argumentou que havia sido vítima de racismo por parte de seus colegas franceses.
No entanto, segundo Noah Charney, ele havia feito uma lista de colecionadores de arte americanos, o que indicava que ele tinha planos de vender a obra.
Há outras hipóteses sobre os motivos do ladrão, mas até hoje a verdadeira razão permanece um mistério.
Peruggia não era um conhecedor de arte. Parte do motivo pelo qual ele escolheu a Mona Lisa era o seu tamanho pequeno: o quadro mede 53 por 77 centímetros.
Desde do retorno do quadro ao Louvre, pessoas de todas as partes do mundo vão visitar a Mona Lisa mas, segundo Coignard, este pequeno e íntimo retrato requer calma e tempo para ser realmente apreciado.
É por isso que poucos realmente “veem” a pintura; o que importa é estar ali e poder dizer que a viram, avalia o escritor francês.
Apesar do mito, o ladrão foi rapidamente esquecido depois de capturado, especialmente por causa da Primeira Guerra Mundial, que começaria no ano seguinte, 1914.
“As pessoas pensam nele como alguém extravagante e adorável, que se apaixonou por uma obra de arte e que não a danificou”, diz Charney.
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