
Elias de Lemos (Correio9)
A Revolução Cubana foi consolidada em 1959, tendo como líderes, Fidel Castro e Ernesto Che Guevara, que de uma área em um canto da ilha, chamada Sierra Maestra, conduziram o movimento guerrilheiro.
O combate, liderado por Fidel, buscava derrubar a ditadura de Fulgêncio Batista, instalada em 1952. Após muitos ataques, o ditador caiu e o novo governo passou a ser chefiado por Fidel e seu irmão Raul Castro.
Fidel realizou grandes mudanças, que provocaram descontentamento nos Estados Unidos, que acabaram rompendo relações com Cuba. De lá para cá, a nova ditadura já ultrapassa 60 anos.
No entanto, nas palavras do rapper Maykel Obsorbo: “Há coisas que estão mudando” no país. Ele foi o centro de uma onda de protestos que varreu a ilha em abril questionando a legitimidade do regime e clamando por democracia.
Em julho, os manifestantes voltaram às ruas e sofreram forte repressão. Estima-se que pelo menos 100 ativistas foram presos, além de muitos jornalistas.
Enquanto a ilha fervia com os protestos, os expoentes da esquerda brasileira passaram pano na crise cubana. Guilherme Boulos, Dilma Rousseff e Lula minimizaram a gravidade da situação.
Lula questionou: “O que está acontecendo em Cuba de tão especial para falarem tanto?”. Em outra ocasião, ele classificou os protestos como “passeata”, sem falar na dura repressão por parte do governo e nem mencionar a ditadura cubana.
O regime político cubano é uma pedra no sapato da esquerda brasileira. É um tema que assombra, especialmente, os petistas, assim como o tema corrupção. Desde os primeiros escândalos do mensalão, em 2005, o PT tem sempre o mesmo comportamento com os corruptos dentro do partido. É sempre condescendente e isso atinge todo o partido como se fosse uma coisa só.
Cuba passa pela terceira e pior onda da pandemia do novo coronavírus, as quedas de energia são constantes e enfrenta escassez de produtos básicos, como materiais de higiene, remédios e alimentos. Mas, para a esquerda brasileira, não houve levante popular, houve “passeata”.
Comportamento idêntico foi adotado com a ditadura de Hugo Chávez e depois de Nicolás Maduro, na Venezuela.
Apoiar a ditadura cubana sem olhar para seus efeitos negativos sobre a vida, as liberdades e os direitos humanos daquela população é uma contradição petista que destoa do discurso do partido em defesa da democracia no Brasil.
Aqui, a esquerda está no campo das chamadas “forças progressistas”, justamente aquelas que defendem a democracia e os direitos humanos. Defende aqui, mas passa o pano quando fala de Cuba.
Os protestos por melhores condições de vida e liberdade que têm confrontado o governo cubano coloca o PT em uma sinuca de bico. Com Lula em pré-campanha para a presidência em 2022, o partido se apoia no discurso de defesa da democracia e das liberdades para combater o projeto ditatorial do presidente Bolsonaro, e tem bagagem para isso.
O respaldo petista contra Bolsonaro vem do fato de o PT ter governado respeitando o Congresso e outras instituições de Estado, como o Poder Judiciário, a Polícia Federal e o Ministério Público. Além disso, é do PT a Lei de Acesso à Informação. Tudo isso legitima as críticas do partido ao governo atual.
No entanto, se por um lado o PT tem uma bandeira política clara no Brasil, o mesmo não se aplica aos “aliados” externos. Ainda quando ocupava a Presidência, em plena ditadura chavista, Lula chegou a afirmar que a Venezuela tinha democracia demais. Ele sempre defendeu a tese indefensável de que Cuba tem um governo democrático.
Para não condenar o governo cubano, Lula culpou o embargo econômico imposto pelos Estados Unidos pelos inúmeros problemas enfrentados pelo país. Foi uma boa saída, mas não suficiente para explicar a revolta popular.
Lula encontrou uma resposta para a crise cubana, mas, ainda será questionado sobre a Venezuela e, nesse caso, qualquer declaração favorável coloca o discurso petista em contradição. O regime venezuelano implantado pelo coronel Hugo Chavez se apoiou nas Forças Armadas e na formação de milícias paramilitares.
A posição da esquerda brasileira em relação a Cuba e Venezuela cria uma situação difícil para o PT, pois fortalece o discurso requentado de que a esquerda representa um perigo para o Brasil e que quer implantar o comunismo por aqui.
Situar no mesmo campo ideológico não exige que seja igual, mas o comportamento da esquerda brasileira deixa a entender isso. Falta a Lula esse discernimento, aprender a separar o joio do trigo.
* O autor é economista, professor, jornalista, escritor e editor-chefe do Correio9
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