CRÔNICA
Renata Helena Colombi *
Fui criada numa família musical. Meus avós paternos eram do Coral. Meu saudoso pai cantava bem. Tios e tias também. Era um ambiente cheio de sons. De todos os tipos.
Minha imaginação corria rápida e eu viajava nas letras das músicas. Tenho uma característica peculiar: a de criar imagens mentais daquilo que leio e ouço. Acontece com tudo, o tempo todo.
Com a letra de “Ai, que saudade da Amélia” não foi diferente. Composta por Ataulfo Alves em parceria com Mário Lago e lançada em 1942. Eu era jovenzinha e imaginava como seria a vida daquela “mulher de verdade”, sem a “menor vaidade” e que achava “bonito não ter o que comer”. Alguma coisa em mim estranhava na mesma cadência em que o samba tocava.
E a história se repetiu com “Marina, morena” de Dorival Caymmi, lançada em 1946. Só que dessa vez foi diferente. Estava cantarolando e de repente a pergunta: e se Marina respondesse?
Caymmi, querido, Caymmi! Eu me pintei, sim!
Base, corretivo, batom. Abusei da cor carmim.
Eu pinto meu rosto porque eu gosto. Eu gosto e é só meu.
Caymmi, sou linda e a paleta foi Deus que me Deu!
Já saí por ai, me joguei na vida a dançar.
E quando eu me jogo, Caymmi é pra arrasar!
Eu já conquistei tanta coisa. Você não arranjava outra igual.
Desculpe Caymmi, querido, eu vou pra geral!
Pra geral, sem você! Na geral, sem você!
Gostaria de ouvir da “Amélia” e de tantas outras mulheres cantadas pelo imaginário masculino em tempos idos ou vindos, se essa imagem é delas mesmo.
Espero, até agora, ouvir as vozes das meninas retratadas na música “Baile de Favela”, de 2016, logo ali, virando a esquina do tempo e ovacionada nas Olimpíadas na rede globalizada de televisão. São vocês, meninas?
Enquanto aguardo, grito: Latino, a Renata não é ingrata!
* A autora é economista, cronista e mãe
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