“Você pode me ajudar”. A frase, seguida de um “Xis” e das palavras “violência doméstica”, foi escrita por uma mulher, de 27 anos, dentro de uma agência bancária em Sobradinho, no Distrito Federal, na última segunda-feira (1º).
A vítima estava em um caixa, fazendo o saque do Bolsa Família, e entregou o bilhete ao funcionário do banco. No texto, ela ainda alertou: “Ele tá aí fora”.
Por causa da pandemia de Covid-19, só é permitida a entrada na agência de uma pessoa por vez. Enquanto a mulher sacava o dinheiro, o marido aguardava do lado de fora.
O bancário entendeu o pedido de socorro e foi atrás da polícia com os colegas da agência. No dia seguinte, a polícia foi até a casa da vítima, que foi encaminhada para uma Casa Abrigo. O agressor, entretanto, não foi encontrado no local.
O desenho do xis com o pedido de ajuda é uma orientação da campanha, lançada em junho de 2020, para ajudar mulheres vítimas de violência doméstica.
O homem, de 40 anos, contou que na hora em que recebeu o bilhete, pediu para a vítima anotar os dados, como telefone e endereço. “Mas a mulher ficou com medo de passar o telefone e o companheiro atender”, disse.
“Depois que ela foi embora, fiquei procurando uma forma de ajudá-la. Fizemos uma pequena reunião para ver o que poderíamos fazer”, contou.
Dificuldade para conseguir ajuda e descaso
Junto com colegas do banco, o funcionário que atendia a mulher decidiu ir até a 13ª Delegacia de Polícia, de Sobradinho. Mas o policial de plantão não registrou a ocorrência.
“Ele leu, leu, olhou o papel e disse que era jurisdição de Planaltina porque a mulher morava lá. Eu questionei se ele não poderia fazer contato com alguém, mas ele não deu a mínima pra mim”, contou o bancário.
O bancário disse ainda que chegou a ligar para a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) para informar o ocorrido, mas também não foi atendido. “Um homem atendeu e disse que era pra denunciar no 197, porque tinha que apurar se aquilo era verdade mesmo”, revelou.
“Sobra burocracia e falta empatia. Cheguei no outro dia no banco desnorteado”, disse o bancário.
Em nota, a Polícia Civil disse que “o caso está sendo apurado com máxima prioridade” e que prestará todas as informações pertinentes.
Coragem e busca de solução
Uma das pessoas que ajudaram o funcionário do banco na busca por ajuda foi a telefonista da agência.
Após saber das tentativas frustradas do colega para registrar o caso na Polícia Civil, ela decidiu falar com uma amiga, que é policial militar do batalhão de Planaltina. Ela mandou fotos dos bilhetes: o que pedia ajuda e um segundo, onde a mulher escreveu o endereço.
O texto, além do endereço, descrevia como achar a quitinete onde a vítima morava, dando características como a cor do portão. Ao final, a mulher também fazia mais um pedido: para que os policiais insistissem.
“Pela experiência que tenho, no momento em que li os bilhetes, já entrei em contato com uma amiga que trabalha na PM. A vítima foi breve e rápida. Ficamos todos apreensivos”, contou a telefonista.
Final da história
Após a denúncia, policiais militares do grupo de Prevenção Orientada à Violência Doméstica e Familiar (Provid) foram atrás das informações escritas nos dois bilhetes. Ao chegar no endereço, no setor Estância Mestre D’Armas, em Planaltina, eles descobriram que a mulher era mantida em cárcere privado pelo companheiro.
No endereço, em uma segunda tentativa do grupo – na primeira, aparentemente não havia ninguém em casa –, a equipe encontrou a mulher e seus dois filhos: um menino de 1 ano e 7 meses e uma menina 5 anos. A vítima confirmou que tinha escrito o bilhete pedindo ajuda.
Sérgio Borges, sargento da Polícia Militar, disse que a mulher estava com medo.
“Ela confirmou que o marido fazia agressões verbais. […] Percebi que ela estava com medo. Não é de hoje que ela é vítima de violência doméstica”, afirmou.
Em 2019, a mesma mulher já havia sido atendida após uma denúncia de violência. “Agora é com a Justiça. A nossa parte a gente fez. Ela pode receber medida protetiva e, dependendo do entendimento, o juiz expede mandado de prisão pra ele”, explicou o sargento.
A vítima foi encaminhada para uma Casa Abrigo. Até a tarde desta quarta-feira (3), o agressor não havia sido localizado.
Sinal vermelho X
Em janeiro, uma lei com o mesmo nome foi regulamentada. Segundo o texto, para pedir socorro, as vítimas precisam escrever um “X” na palma da mão, com caneta, batom ou outro material acessível, se possível na cor vermelha.
O sinal deve ser mostrado com a mão aberta aos funcionários desses estabelecimentos que, por sua vez, precisam adotar um protocolo de atendimento e acionar as forças de segurança. A medida vale para:
- farmácias;
- repartições públicas;
- portarias de condomínio;
- hotéis;
- supermercados.
O texto afirma que, ao atender uma mulher que apresente o “sinal vermelho”, os funcionários devem manter a calma. A vítima precisa ser encaminhada para uma sala segura, onde possa aguardar atendimento especializado, sem chamar a atenção dos demais clientes ou do possível agressor, que possa estar acompanhando ela. A polícia deve ser acionada imediatamente.
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