Elias de Lemos (Correio9)
Quem vai para outro país para aprender um novo idioma, ou para trabalhar e começar uma vida diferente, a diferença cultural é uma experiência que, em maior ou menor grau, acomete a todos. É o chamado choque cultural produzido pelo contato com uma nova cultura, acompanhado por sentimentos de perda e confusão por estar em um ambiente diferente. É, também, um sentimento de impotência produzido pelo desafio de estar inserido em um novo contexto e pela perda do ambiente de costumes ao qual se está familiarizado.
Há venecianos e venecianas espalhados pelo mundo. Esta reportagem ouviu uma dessas pessoas que narrou sua experiência de mudança.
Há quase dois anos, a veneciana Maria Beatriz Vieira, 40 anos, se mudou com a família para a Itália. O marido José Antônio Júlio do Nascimento – que trabalha com controle de qualidade e, também, é escritor – fora seis meses antes; depois, ela e o casal de filhos Nicole, 13, e Virgílio, 12, seguiram de mudança para a cidade de Padova, na região do Vêneto.
Nesta reportagem do Correio9, ela conta porque trocou de país e como foi a adaptação na “nova terra”: “Eu queria mudança, transformação, não estava feliz aqui, por isso decidi me mudar”, disse.
Ela descreve que a Itália é um país de idosos: “Tem idoso por toda parte, mas é raro ver uma criança, quase não tem criança”.
De acordo com ela, as maiores dificuldades foram em relação à língua, às regras do país e ao clima: “De repente me vi em um ambiente completamente novo, muito diferente daquele que eu estava habituada. A gente precisou aprender a viver naquela sociedade, porque os costumes não são os mesmos. O primeiro ano foi o mais difícil, foi terrível! Mas, passada essa fase, nos sentimos mais seguros”.
Ela disse que os filhos enfrentaram maior dificuldade. Nicole contou que a jornada de estudos é grande, com uma sobrecarga de tarefas escolares e o currículo escolar contém duas línguas estrangeiras. “Eu havia concluído o 9º Ano no Brasil, mas quando cheguei lá, precisei retornar ao 8º para fazer as devidas adaptações do currículo”, explicou a menina.
Mas, se por um lado houve desafios, Beatriz ressalta que, por outro, vieram as oportunidades de aprendizado: “Estamos conhecendo novas culturas e etnias, novos costumes. Percebi que, ainda, temos muito a aprender”.
Ela explicou que arrumar trabalho foi muito difícil: “No Brasil, eu trabalhei 26 anos com massoterapia. Mas, lá na Itália meu currículo e meus certificados não eram aceitos. Vencer no exterior é vencer a si mesmo, é mudar a sua forma de ver o mundo e não desistir. Eu não desisti; fiz o que me pediam, o que eu precisava fazer para me colocar no mercado de trabalho. Hoje eu trabalho mais lá do que trabalhava aqui no Brasil”.
Beatriz se diz admirada com os costumes do Lugar: “Lá, ninguém vai à casa do outro sem avisar, sem combinar antes. As lojas fecham e deixam bancas com produtos nas calçadas e ninguém rouba, porque a lei para o ladrão e para o assassino são as mesmas. A gente não tem medo lá! Além disso, não se vê pobreza e nem gente morando nas ruas”.
Ela fala da diversidade de culturas e religiões e diz que tem aprendido muito com novas crenças que conheceu e começou a respeitar: “Respeito lá é tudo! As pessoas se põem no lugar das outras. E desse modo, percebemos o quanto temos em comum. Por exemplo, nos conhecemos agora (no momento da reportagem), mas há um pouco de mim em você, do mesmo modo que há um pouco de você em mim; todos estamos conectados, por isso, somos iguais”.
A veneciana destaca como é o governo italiano: “Lá, a educação, a segurança e o sistema de saúde funcionam. O governo sabe mais sobre meus filhos do que eu. É uma experiência nova viver em um lugar onde o governo se preocupa e cuida das pessoas”.
Com tantas coisas positivas, parece que na Itália não há problemas. No entanto, Beatriz chama a atenção para a quantidade de suicídios, que segundo ela, são comuns, em contraste com a harmonia social.
A Região do Vêneto
Vêneto é uma região do Nordeste da Itália que se estende das montanhas Dolomitas ao Mar Adriático; Veneza, a capital regional, é famosa por seus canais, sua arquitetura gótica e suas festas de carnaval. Vêneto fez parte da poderosa República de Veneza por mais de 1.000 anos, entre os séculos VII e XVIII. Próxima ao Lago de Garda, a medieval Verona é conhecida como cenário da peça “Romeu e Julieta”, de Shakespeare.
Beatriz mora próximo a Veneza e Milano. Ela destaca a riqueza cultural, histórica e religiosa da região.
Ela já visitou a Praça Del Valle (em Pádua), a Igreja de Santo Antônio de Pádua e falou, também, das Igrejas de Santa Justina, onde estão as relíquias de São Lucas, e a de São Marcos, em Veneza, que guarda as relíquias do evangelista.
Além disso, a família já conheceu a Casa de Romeu e Julieta, que fica em Verona.
A Vinda a Nova Venécia
Beatriz veio ao Brasil às pressas para o funeral da irmã, a professora Maria Elizabeth Vieira Lourenço, a Bethinha, que faleceu no dia 25 de agosto vítima de complicações causadas por um AVC (Acidente Vascular Cerebral).
Ela é natural do Patrimônio do XV, no interior de Nova Venécia – onde seus pais, dona Maria Helena, 72, e o senhor Virgílio, 93, moram: “Estou voltando, mas de coração partido por deixar meus pais aqui, principalmente depois da perda da minha irmã, que mexeu com a nossa família. Vou rezando por eles, para que fiquem bem”, disse.
Por fim declarou: “Aprendi a gostar da Itália, que tem me ensinado muita coisa, só não me ensina a esquecer do Brasil”.
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