Por Elias de Lemos (Correio9)
Tudo estava relativamente normal na vida de Janaína Sarmento Malta Baldo, de 46 anos. Ela e a sua família estavam dedicados a cuidar da saúde de seu pai, o jornalista Carlos Alberto Malta, que havia sofrido um infarto. Era dezembro de 2017 e ela, usando um tablet, digitava um trabalho resultante de um curso que fazia no Salão do Reino das Testemunhas de Jeová. Quase no encerramento da digitação o aparelho “pifou” e todo o trabalho foi perdido. Triste e em lamento, ela debruçou-se sobre a mesa. Foi aí que…
Ao debruçar-se, sua mama direita tocou a mesa causando uma forte dor, e ela levou a mão ao seio na tentativa de “segurar a dor”. Ao fazer isso, Janaína percebeu um pequeno “carocinho”. Segundo a sua descrição, ele não passava do tamanho de um grão de arroz.
Janaína contou que fazia a mamografia regularmente e nunca deixara de fazer o autoexame. Aliás, isso aconteceu vinte dias após fazer o preventivo. A identificação foi difícil: “Era tão pequeno que depois que a dor passou eu perdi o local e tive muita dificuldade para localizá-lo novamente, aí quando o encontrei, marquei o ponto com uma caneta”.
O passo seguinte foi procurar uma médica. Ao relatar o assunto, ela ficou decepcionada. Primeiro a “especialista” disse: “Deve ser um cisto”. Ela insistiu para fazer uma ultrassonografia; a médica respondeu: “A especialista aqui sou eu, você é muito ansiosa”, e disse a ela para esperar mais um ano.
Diante das negativas, deixou o consultório, fechou a porta, mas, não soltou a maçaneta. Voltou em seguida e exigiu um pedido de ultrassonografia. Com raiva a médica fez o pedido.
Com o papel em mãos, Janaína foi a Colatina realizar o exame. E ao receber o resultado, para sua surpresa, acusou cinco nódulos.
O médico que a atendeu em Colatina pediu para ela procurar outro especialista e abandonar a médica que negligenciou seu caso.
Ela retornou para Nova Venécia para acompanhar o pai em uma cirurgia cardíaca que foi feita na cidade de Linhares. Na volta, parou em São Mateus onde procurou uma médica.
Com a morte do pai, a quem era muito apegada, Janaína acabou esquecendo-se do problema que enfrentava. No entanto, voltou ao consultório – em São Mateus – algum tempo depois, de onde foi encaminhada para um especialista em mama, na cidade de Colatina.
Em 10 de agosto de 2018 fez uma biópsia, cujo resultado saiu 15 dias depois. Porém, o médico que analisou o laudo não aceitou fazer a cirurgia por uma razão religiosa; Janaína e o marido Luiz Junior Baldo fazem parte das Testemunhas de Jeová, cuja crença recomenda a não realização de transfusão de sangue. Assim, mesmo com a remota possibilidade de precisar de sangue, o médico não quis correr o risco.
Mesmo não aceitando fazer a operação, o médico colatinense solicitou todos os exames pré-operatórios; oito no total. Ao procurar por laboratórios ela se deparou com mais uma negativa: não encontrou nenhum que fizesse todas as oito análises.
Já era outubro de 2018 e ela continuava a procurar algum médico que aceitasse o desafio de operá-la. Ela fez uma lista com 52 mastologistas do Espírito Santo e pediu ao médico, de Colatina, para indicar um, mas ele se recusou, não apresentou a “mínima boa vontade de ajudar”.
Mas, apesar de tantas negativas, negligência de uma médica e a dificuldade para realizar os exames, ela não descansava e continuava sua busca, sempre otimista.
Ao procurar uma clínica em São Mateus, Janaína encontrou o apoio de que precisava. Se antes todos negligenciaram seu caso, lá ela conta que foi “acolhida com carinho, cuidado e respeito”.
Na primeira clínica que chegou, ela se deparou com uma atendente que passara pelo mesmo problema. Os exames foram realizados em lugares diferentes, porém, todos foram agendados para o mesmo dia.
Com os exames prontos, o passo seguinte foi a cirurgia. Janaína procurou o Hospital Meridional, também em São Mateus; onde foi atendida pelo oncologista químico Erasmo Brito Xavier e pelo oncologista cirúrgico Euvaldo Jorge. Ela se emociona ao falar deles. Segundo ela, nunca encontrou médicos “tão humanos”.
“Pra mim, a chave para o sucesso num tratamento como esse, com certeza são Deus, a família, amigos verdadeiros e uma boa equipe médica. Graças a Jeová, tenho tido todos esses elementos”, disse.
“Passei por muitos médicos que não explicam nada ao paciente, conheci a filha de uma mulher que veio do Tocantins para se tratar aqui no Espírito Santo, os médicos que a atenderam fizeram a passar por quimioterapia durante cinco anos até ela morrer por causa da negligência deles”, exemplificou.
Segundo ela, o doutor Euvaldo foi muito cuidadoso ao dizer que os nódulos estavam espalhados e que, em razão disso, não havia espaço necessário entre eles para retirar partes da mama, mas que seria necessário fazer uma retirada total. Porém, para a surpresa dele, sua paciente declarou-se aliviada e respondeu que “se ele falasse para retirar parte eu pediria para retirar a mama inteira, eu iria ficar muito preocupada depois”. Dito isso, ele organizou uma equipe multidisciplinar para realizar a operação.
Depois da cirurgia, ela começou, em 17 de janeiro de 2019, a fazer quimioterapia intermediária. Foram 14 sessões. Agora, está em processo de hormonioterapia, cujas aplicações ocorrem a cada 21 dias. O tratamento é necessário para prevenir contra qualquer resquício que a quimioterapia possa ter deixado, porque o câncer que afetou Janaína é de fácil metástase.
Atualmente, ela espera para fazer a cirurgia de reconstrução mamária. Enquanto isso, convive com o incômodo de usar um objeto estranho, chamado ‘expansor’, que foi colocado no lugar da mama retirada. Ele foi posto bem pequeno e desde então, foi recebendo injeções de gel para aumentar o volume para esticar a pele. Ela explica que a pele que recobria a mama foi retirada, com isso o médico puxou pele da parte de cima e do lado para fazer a sutura; então a função dele é forçar a formação de uma nova cobertura.
O problema é que o expansor causa muita dor. Segundo ela, está dormindo na mesma posição desde dezembro de 2018. “Para mim, o problema não foi a doença em si, encarei com fé, mas o tratamento é que é muito cansativo”.
Mesmo diante da “via sacra” que enfrentou até conseguir ser acolhida, Janaína não desanimou; conta que procurou manter sua rotina, poucas atividades foram reduzidas, entre elas a visitação que os fiéis de Jeová costumam fazer às casas das pessoas: “É uma atividade que eu adoro”, falou. No entanto, ela procurou ter “alegria”.
E a perda dos cabelos? “Não foi fácil, mas não foi o fim do mundo!”.
Ela disse que tem sido procurada por muitas pessoas, que passam pelo mesmo problema, pedindo orientação e se sente gratificada por ajudar: “Digo: pesquise sobre a sua doença, não tenha medo dela. Quanto mais informação você tiver, melhor você vai cobrar, é preciso questionar o médico sobre o melhor tratamento; procure conhecer a medicação. Mas encare com otimismo, sem se entregar à doença”.
“Ah! E sorrir sempre. Mesmo que o dia não seja tão bom. Sorrir vai torná-lo melhor. Não falo que tem dias ruins. Digo que tem dias bons e dias melhores”.
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