Equipe Correio9
O Correio9 vem produzindo reportagens sobre mudanças de comportamento geradas pela internet. A facilidade de comunicação proporcionada por ela revolucionou relações, influencia comportamentos sexuais e agilizou o comércio ampliando as possibilidades de negociação, com a venda de todos os tipos de produtos, sejam novos ou usados, nacionais ou importados. O meio é abrangente e cria possibilidades.
Aproveitando-se dessa característica, golpistas estão utilizando as redes sociais para comercializar ilegalmente. Em grupos de WhatsApp eles oferecem os mais variados produtos falsos. É possível comprar dinheiro, cartões de crédito em nome de terceiros e diplomas: tudo falso. Há, também, os vendedores de CNH os quais garantem que são originais registradas no Detran do Estado do interessado.
A reportagem do Correio9 teve acesso a várias postagens em que os criminosos oferecem as mercadorias ilegais em grupos da rede social WhatsApp. A publicidade é ousada e inclui vídeos apresentando algum serviço e o sistema de entrega. O material foi obtido através da mesma estratégia utilizada em 2018, quando foi feita a reportagem “WhatsApp do Sexo”.
A reportagem começou a ser produzida no início do mês de outubro, quando a equipe voltou a se infiltrar em grupos que oferecem sexo pelo aplicativo, com o objetivo de observar se houve mudanças de 2018 para cá. A equipe circulou pelos mesmos cinco grupos que fundamentaram a reportagem “WhatsApp do Sexo”.
Uma das postagens diz: “Dinheiro rápido na sua mão pra você pagar suas contas e etc, envio direto na (sic) sua casa para tirar você do sufoco. Nunca mais você vai ficar sem dinheiro! Passa no teste da caneta”.
Outro anúncio coloca à venda cartão de crédito em nome de terceiros e avisa que “não é clonado”. A mensagem diz: “Cartões em nomes de terceiros, desbloqueados e já vai (sic) com senha para uso imediato”.
Segundo as conversas salvas dos grupos de WhatsApp, os estelionatários trabalham com cartões de créditos nacionais e internacionais em nomes de terceiros; os cartões são desbloqueados e com limites variados. O preço cobrado dependerá do limite.
No entanto, são vários ofertantes que apresentam os serviços, o que permite aos compradores pesquisarem os melhores preços. Um deles oferece diversas opções aos interessados: cartão de crédito com R$ 5 mil de limite pelo preço de R$ 550; cartão com R$ 6 mil de limite à venda por R$ 600; cartão com R$ 7 mil de limite por R$ 700; cartão com R$ 8 mil de limite por R$ 800; cartão com R$ 9 mil de limite por R$ 900; e cartão com R$ 10 mil de limite por R$ 1.000;
A propaganda garante segurança na entrega. Há, inclusive, vídeos demonstrando a forma como o material é embalado e inclui rastreador da encomenda. De acordo com um desses golpistas, o cartão, desbloqueado e com a senha, é entregue em um prazo de 24h, pelo serviço Sedex 10, dos Correios, após o pagamento do valor. Como garantia, ele afirma que possui referências de pessoas que já compraram o produto e que envia os dados necessários para o comprador acompanhar a entrega pelo serviço de rastreamento dos Correios, na internet.
Membros dos grupos reagem contra as postagens. Muitos avisam que o grupo não é para isso, enquanto outros alertam que a venda é ilegal. “Isso é crime e dá cadeia. Ainda mais fazendo isso na net, onde nada se perde.
Cuidado”, comentou um dos membros. “As pessoas são enganadas porque sempre querem tirar proveito fácil, mesmo sabendo que é ilegal. Acorde povo, isso é crime”, completa uma mulher. Enquanto isso, um homem manifesta interesse no produto: “E o nome tem que estar limpo? É seguro mesmo?”.
Um homem oferece dinheiro com opções de valores. No texto, ele avisa que são notas “fakes”, mas dá “todas” as garantias de que elas circulam sem restrições: “Notas fakes; modelos novos, passa fácil, teste da caneta, teste do neon, marca d´agua, ásperas, selo holográfico, idênticas às originais”.
A coisa é tão sofisticada que o vídeo “institucional” apresenta o golpe como uma “empresa” que tem até nome, e que produz o material. Já o dinheiro falso é oferecido em lotes. Eles garantem qualidade no serviço. Na publicação, os estelionatários afirmam que comercializam notas de todos os valores: “Tenho notas de 5, 10, 20, 50 e 100”, esclarece ele.
Há, também, o pacote promocional: por R$ 100,00 verdadeiros, garantem eles, o comprador recebe R$ 1.000,00 em notas falsas. Já pelo valor de R$ 200,00 o comprador leva R$ 1.700,00 em notas falsas. O pagamento é feito por transferência ou depósito bancário.
Falsificar, fabricar ou alterar moeda metálica ou papel moeda de curso legal no país ou no estrangeiro é crime previsto no artigo 289 do Código Penal. A pena varia de três a 12 anos de prisão e multa.
CNH original também é ofertada
A venda de Carteira Nacional de Habilitação (CNH) também acontece, porém, os vendedores garantem que são originais registradas no Detran de qualquer Estado. O primeiro passo é a escolha da categoria da CNH. A categoria A (moto) é vendida por R$ 800, seguida pela B (carro) por R$ 1 mil, C (transporte de carga) por R$ 1,2 mil, D (lotação) por R$ 1,7 mil e E (carga pesada) por R$ 2 mil.
As mensagens têm apelo: “Essa é pra você que precisa de CNH rápida e de um jeito prático e seguro sem burocracia, sem aulas do Detran; você que não tem tempo, fez todo o processo e não obteve o resultado esperado e não está disposto a fazer novamente. Eu, consigo resolver seu problema!”. Em seguida o vendedor posta outra: “CNH original registrada no Detran do seu estado. Podendo ser apresentada em qualquer situação, não dará problema algum”.
A reportagem do Correio9 entrou em contato com o vendedor como se fosse um interessado comum. Ele disse que começou vendendo em sua região e, como estava vendendo muito, como o “negócio deu certo”, resolveu anunciar pela internet.
Existe até uma política de preços e condições para a venda de CNH: o pagamento pode ser dividido em duas vezes, sendo 50% antes e a outra parte 30 dias após o recebimento por parte do comprador. Tudo por depósito bancário.
Há, também, critérios como, por exemplo, para a CNH provisória que é fornecida e a definitiva é entregue um ano depois. A entrega é feita via Sedex, sem ônus para o comprador. Após o envio da encomenda o cliente recebe os dados do comprovante de envio, e o número do Sedex para ser feito o acompanhamento e rastreamento da “mercadoria”.
O condutor que for pego dirigindo com carteira de motorista comprada será punido de acordo com o que prevê o art. 297 do Decreto-Lei n° 2.848, de 1940. “Art. 297 – Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro, a pena de reclusão é de dois a seis anos, e multa em dinheiro”.
Diplomas em diversas áreas
O mesmo comerciante de CNH, também, vende diplomas falsos em diversas áreas. Os valores cobrados variam muito, mas, normalmente, estão entre R$ 300 e R$ 900 para ensino médio e entre R$ 1.000 e R$ 3.000 para o nível universitário. O preço varia de acordo com o curso. Os mais caros são de Direito e Medicina.
Ele garante que o diploma tem as mesmas características de um verdadeiro. No entanto, ao contrário da CNH, que é registrada no Detran estadual, o diploma não tem registro no Ministério da Educação.
Um detalhe curioso é que o diploma vai acompanhado de histórico escolar. Segundo ele, já distribuiu o documento em “todo o Brasil”.
Ele disse que já recebeu muitas reclamações de clientes que compraram o diploma. Porém, ele disse que seu negócio é honesto: “Não vou te enganar, porque meu negócio é honesto, a CNH é registrada no Detran, é original, mas o diploma não tem registro no MEC; então a pessoa já compra sabendo, então não tem que reclamar depois”, disse.
O envio, também, é feito por Sedex. E o pagamento por depósito bancário. Questionado sobre garantia de recebimento do documento, ele respondeu: “Mano, meu negócio é sério, honesto”.
Entretanto, comprar um diploma falso, além de representar um problema moral, também é crime e está tipificado nos artigos 297 e 304 do Código Penal Brasileiro, de modo que, responde pela mesma pena tanto aquele que fabrica o diploma falso, quanto aquele que faz uso do documento. A pena para quem for flagrado é de dois a seis anos de prisão, e multa.
Armas e munições
O comércio ilegal de armas de diversos calibres acontece abertamente no WhatsApp, sem qualquer fiscalização. Anonimamente, a reportagem do Correio9 trocou mensagem com o vendedor por meio de um número de WhatsApp divulgado na rede social.
Os preços partem de R$ 2.800 podendo chegar a até R$ 30 mil, dependendo da arma e do calibre. Há revólveres, pistolas, rifles e até fuzil.
Segundo ele, basta o envio de um comprovante de residência para que a entrega das armas seja feita em domicílio em até quatro dias “por uma transportadora de confiança” após o depósito bancário do preço integral. Questionado sobre condições de venda, ele disse que é somente à vista, não há prazo nem parcelamento do pagamento. Sobre a situação dos equipamentos, ele disse que as armas não têm registro.
É importante lembrar que, por lei, o comércio de armas pode ser feito apenas por fábricas e lojas especializadas cadastradas ou entre pessoas que têm posse ou porte de arma em dia e, mesmo assim, mediante autorização da Polícia Federal ou do Exército. O comércio ilegal de armas, assim como a exposição dos produtos, é crime com pena de até oito anos de prisão e multa.
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