Enquanto alguns políticos estão mais preocupados com questões como a segurança pública ou a educação dos brasileiros, outros parecem se atentar a temas um pouco mais inusitados. É o caso do deputado Charlles Evangelista, filiado ao PSL (o mesmo do presidente Jair Bolsonaro) do estado de Minas Gerais, que está tentando criminalizar alguns estilos musicais no Brasil.
De acordo com projeto de lei entregue pelo parlamentar no último mês de setembro, a ideia é tipificar como crime os estilos musicais que utilizem “expressões pejorativas ou ofensivas”. A proposta ainda será analisada por comissões da Câmara.
O texto original do projeto detalha melhor o que seria considerado como “pejorativo ou ofensivo” e exemplifica:
- letras que façam apologia ao uso e tráfico de drogas e armas;
- à prática de pornografia, pedofilia ou estupro;
- que tenham ofensas à imagem da mulher;
- ou que estimulem o “ódio à polícia”.
A ideia pode afetar, em especial, alguns estilos musicais que são aclamados, mas dividem a opinião de parte da população há algum tempo, como o funk, o hip hop e o rock, entre outros.
Todos os casos que se enquadrassem nessas categorias seriam proibidas por lei e, em caso de praticadas por autores e cantores, seriam julgadas e punidas criminalmente.
EXPLICAÇÃO DETALHADA
Para justificar a ideia, Charlles Evangelista – que quase foi expulso do partido em fevereiro deste ano – alega que a proibição seria uma maneira de “garantir a saúde mental de famílias, crianças e adolescentes”.
“Este projeto de lei se baseia no fato de haver um grande desrespeito a moral pública, causado quando há a reprodução de canções que contenham expressões pejorativas ou ofensivas em ambientes públicos. O mal-estar se deve ao conteúdo explícito das letras, que abordam temas de cunho sexual e, por vezes, fazem apologia a crimes. Desse modo, a criminalização de estilos musicais nesse sentido seria uma forma de garantir a saúde mental das famílias e principalmente de crianças e adolescentes que ainda não tem o discernimento necessário para diferenciar o real do imaginário”, escreve o texto original.
Seguindo a lógica apresentada pelo deputado no projeto de lei, é possível inferir que ele se incomode, principalmente, com gêneros musicais de forte apelo popular, como os já mencionados funk, hip hop ou rock. No entanto, parando para analisar a lista de proibições, a lei impediria boa parte da produção musical da história do país a ser reproduzida novamente.
CASO ANÁLOGO
Em meados de 2017, o senador Romário Faria (PSB-RJ) convidou uma série de cantores de funk para participar de uma audiência pública sobre a ideia de lei que propõe criminalizar o estilo musical no Brasil. Na época, o anúncio foi feito por meio do perfil do político e ex-jogador de futebol, sorteado para ser o relator da proposta, no Facebook.
Os artistas convidados por Romário Faria são: Anitta, MC Marcinho, Cidinho e Doca, MC Koringa, MC Bob Rum, Valesca Popozuda, Buchecha e Tati Quebra Barraco. Os antropólogos Hermano Vianna e Mylene Mizrahi, a produtora de eventos Carol Sampaio e o autor da ideia de lei, Marcelo Alonso, também foram chamados pelo senador.
Na ocasião, Romário Faria se declarou contra essa proposta, definindo-se como “um carioca nato e um eterno funkeiro”. “Além de ser inconstitucional, por atentar contra a liberdade de expressão, o funk tira pessoas do desemprego, gera renda e movimenta a economia. Como bem disse a presidente da comissão, senadora Regina Sousa, o funk começou no Rio de Janeiro, mas ganhou o Brasil. Se tornando mais um ritmo musical que expressa a identidade de uma grande parcela da população”, disse.
Entre os artistas convidados para a audiência, Anitta é quem mais se destacou ao falar sobre a proposta de criminalização do funk. Pelo Twitter, ela criticou o argumento da ideia de lei. “Tá tudo ok com o Brasil já? Achei que tivesse coisa mais séria para se preocupar do que com um ritmo musical que muda a vida de milhares. O funk gera trabalho, gera renda pra tanta gente. Uma visitinha nas áreas menos nobres do nosso país e vocês descobririam isso rápido”, publicou ela.
Entrevistado pelo portal ‘Uol’ na época, o autor da ideia de lei, o empresário Marcelo Alonso, disse que pensou na proposta após o Facebook suspender a página que ele mantinha contra o funk. “O Mark (Zuckerberg, criador do Facebook) mandou fechar a minha página por causa do que postamos lá. Mas se o funk for crime, vão ter que obedecer, porque é lei. Estou apenas defendendo o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente)”, afirmou.
A proposta foi rejeitada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado em 21 de setembro de 2017.
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