Elias de Lemos (Correio9)
Em um tempo em que a intolerância e o preconceito imperam os movimentos e as lutas de classe são essenciais. É isso que três organizações sociais: Conen, Rema e Jurema estão fazendo.
A professora e ativista Leide Maria Fagundes Alves é uma das lideranças do movimento em Nova Venécia. Nesta entrevista ela fala sobre o trabalho desenvolvido pelos movimentos organizados.
Correio9 – O que são essas entidades?
Leide Maria Fagundes Alves – O Conen é uma organização do movimento negro, a sigla significa Coordenação Nacional de Entidades Negras e o Rema é Rede de Matriz Africana e a Jurema cuida da questão indígena, são três órgãos que a gente milita. No estado nós temos como coordenadores o doutor Geovan e o mestre Geova e em Nova Venécia a gente milita na região Norte.
Correio9 – Quais são os objetivos dessa organização?
Leide Maria Fagundes Alves – É trabalhar as comunidades tradicionais a respeito do racismo, racismo estrutural e a injuria racial. Porque existe diferença entre os dois termos. O racismo é contra um grupo, uma etnia; já a injúria racial é contra uma pessoa de acordo com a cor de sua pele. É nesse contexto que a gente trabalha.
Outro objetivo importante é lutar pelos territórios junto com os movimentos quilombolas, indígenas e ciganos. Por que esses três povos? Por que no Brasil a gente poderia dizer que são “Brasis”, porque são vários povos. Nós estamos trabalhando com as minorias que podemos dizer que representam 90% do povo brasileiro. Então o Conen tem esse papel nos níveis estadual, nacional e internacional.
Correio9 – Como esse trabalho é feito dentro da sociedade?
Leide Maria Fagundes Alves – Quando alguém sofre alguma discriminação racial nós encaminhamos para os órgãos competentes, fazemos o papel de conscientização das pessoas para que elas enxerguem, porque tem casos que a pessoa sofre uma discriminação dentro do próprio trabalho e não percebe. As pessoas que estão do lado de fora que percebem, por exemplo, tem uma pessoa com menos melanina, outra com mais melanina aí você cita uma que faz coisas negativas e a outra que faz coisas positivas, assim você está utilizando do racismo, da injúria dentro do trabalho. Dentro das organizações quem tiver qualquer problema relacionado com preconceito ou injúria racial pode nos procurar; meu nome é Leide Maria Fagundes Alves e nós temos outros companheiros.
Correio9 – Como as pessoas podem acessar esse movimento, como elas podem buscar ajuda?
Leide Maria Fagundes Alves – Elas podem entrar em contato comigo, inclusive nós temos feito esse trabalho e temos encontrado vários problemas de racismo e de injúria racial aqui em Nova Venécia. Temos encaminhado as pessoas para procurarem os seus direitos porque aí é a pessoa que tem que sentir o problema porque muitas vezes ela está tão sofredora naquele momento que ela não enxerga que foi discriminada.
As pessoas precisam ter cuidado na hora de tratar com as outras para não se utilizarem de racismo e a gente trabalha nesse contexto; é um movimento social que trabalha todo o contexto dos direitos humanos. Nós não fazemos nada mais nada menos do que seguir a Constituição Federal e trabalhar os direitos humanos no campo das comunidades cigana, indígena e africana.
Correio9 – É um trabalho pelos direitos.
Leide Maria Fagundes Alves – Isso. É muito importante as pessoas saberem dos seus direitos e dos seus deveres porque a gente tem direitos e tem deveres; é uma via de mão dupla. O movimento tem palestras, encontros internos. Nós tivemos um seminário em Nova Venécia e vieram representantes de vários movimentos e de várias entidades, 80 pessoas participaram porque nós ainda estamos na academia e nós temos tido um cuidado muito grande com muito amor a ciência e respeito às regras de isolamento e de distanciamento.
Não fazemos um trabalho qualquer, é um trabalho de zelo, também, pela saúde, pela ciência, zelo pelas religiões de matriz africana e, também, as religiões ciganas todas as religiões que lutam a favor do povo.
Correio9 – As pessoas falam que o racismo é uma questão cultural.
Leide Maria Fagundes Alves – Uma questão paralela precisa ser levada em conta ao falar de racismo: é necessário falar do sistema capitalista. O sistema capitalista gerou a homofobia e o racismo, porque se você observar no livro de Karl Marx, no primeiro livro, ele vai dizer da acumulação primitiva. Quais foram as primeiras pessoas que foram vendidas como mercadorias porque não tinham nome, não tinha identidade e nem alma? Foram os nossos ancestrais. Então, não adianta combater o racismo sem combater o capitalismo, os dois andam juntos. As estruturas de classes favorecem o racismo e o preconceito porque tudo que tem de ruim na sociedade é proveniente da divisão de classes.
Nós estamos aí na luta do dia a dia para defender àqueles que sofrem, estamos unidos àqueles que defendem esses grupos, essas comunidades, nós estamos juntos, não importa o que defendem, mas, o que estão defendendo, é o conteúdo que elas defendem, se defendem a justiça ou não.
Correio9 – Você é presidenta da Associação de Moradores do Bairro Iolanda…
Leide Maria Fagundes Alves – E temos algumas demandas lá, como a limpeza dos bueiros, por exemplo, porque quando chove alaga tudo. Outra coisa é a instalação de uma unidade de saúde para atender aos bairros Iolanda e Betânia. E a questão das nascentes, o bairro Iolanda foi construído em cima de nascentes, é uma área com muitas nascentes e eu sinceramente gostaria que os órgãos competentes cuidassem dessas nascentes, tivessem zelo com elas porque lá no futuro a água que a gente utiliza vai faltar, então precisamos preservar e cuidar delas agora; cuidar dessas nascentes para o bem da comunidade.
Outra coisa, na Avenida Guanabara foi feito o asfalto, mas não fizeram sinalização, nem canteiros de plantas para arborizar a avenida. Ficou uma coisa fria, sem vida, eu gostaria que o prefeito de Nova Venécia, o André Fagundes, olhasse essa questão, entrasse em contato com o Governo do Estado, com o Detran, o Givaldo Vieira, com deputados, os vereadores, para resolver esses problemas da Avenida Guanabara porque nós teremos muitos acidentes, teremos mortes naquela avenida onde os acidentes são constantes. Estou solicitando em nome da Associação e da comunidade para que sejam tomadas as providências necessárias.
Ficou uma avenida muito fria e na atual conjuntura que nós estamos vivendo – que está quase passando a pandemia – a gente precisa de verde, de natureza, de vida para depurar as nossas mentes. Além disso, o que produz a chuva são as plantas, então a gente está precisando de planta e a avenida ficou feia demais, sem brilho e nós precisamos de vento e de calor humano.
Correio9 – Para finalizar…
Leide Maria Fagundes Alves – Quero agradecer ao Correio9 pela oportunidade e te agradecer (Elias) por esses 40 anos de luta, você sempre esteve conosco nas lutas do dia a dia nas nossas demandas. Isso é importante porque na atual conjuntura você encontrar alguém disposto a caminhar contigo é muito difícil, alguém defender as minorias, é muito mais difícil. Então, eu quero agradecer de coração em nome do Conen, da Rema e da Jurema e em nome da Associação de Moradores no Bairro Iolanda.
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