Elias de Lemos (Correio9)
Um texto publicado na última quarta-feira (18) em um site do Estado do Espírito Santo chocou até mesmo jornalistas com décadas de estrada. Nele, o autor claramente chama a vice-governadora do Estado, Jacqueline Moraes de “cadela”. Isso mesmo, você não leu errado leitor!
O texto conturbado trata de uma fala do prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), feita no último sábado (17). Na ocasião, sem apresentar nada que pudesse dar lastro às suas denúncias e sem dar nomes, Pazolini falou sobre suposta corrupção no Governo do Estado.
Jacqueline Moraes defendeu o governo que ajuda a construir e, por isso, foi cruelmente atacada pelo autor do texto.
Em um trecho ele descreve: “A vice-governadora tem o atrevimento de uma “vira-lata” que abana o “rabo” para o dono e “late” de longe, salivando ignorância quando o assunto é corrupção no Governo do Espírito Santo”. Você não leu errado!
Em outro trecho, ele escreve: “A vice-governador (sic) serve ao governador com uma fidelidade além canina (sic). Presta-se a serviço até suspeitos (sic) ao envereda-se (sic) nos labirintos do Palácio e todos os seus cômodos como uma deslumbrada. Latir não tem nenhuma serventia. Se fosse honesta como servidora pública paga pelos (sic) contribuintes, buscaria certificar (sic) sobre a tipificação do crime, a menos que a informação também tem (sic) lastro de (sic) comprometê-la”.
Jacqueline Moraes é a primeira mulher eleita vice-governadora do Espírito Santo e, também, a primeira que governou o Estado interinamente. Ela é uma mulher que tem uma história de vida invejável: foi de camelô a vice-governadora.
Jacqueline Moraes é uma cidadã-espelho não só para as mulheres capixabas, mas, para todas as mulheres. Ela é um exemplo de que é possível a mulher conquistar seu espaço e se firmar mesmo com todo o machismo que enfrentam. O texto infeliz, publicado na terça-feira, mostra também o quanto o caminho das mulheres é difícil.
O exercício do jornalismo exige coragem e responsabilidade. O jornalismo precisa contar com a verdade, não pode se ater a ilações ou denúncias preliminares sem a devida investigação que cada caso merece.
O jornalismo não pode se ater a interesses pessoais, tampouco políticos. No entanto, o autor do texto, a que me refiro, não pautou uma crítica. Ele construiu um texto para atacar a mulher Jacqueline, sem se referir ao seu trabalho em nenhum momento.
Seria compreensível se fosse uma crítica ao trabalho, pois, todos têm direito de discordar e de criticar. A crítica é construtiva e ajuda a corrigir descaminhos. Mas não foi essa a intenção do autor do texto recheado de ódio e desrespeito contra a vice-governadora.
A liberdade de expressão é fundamental em uma sociedade; no entanto, não pode ser confundida com liberdade de agressão. Porém, foi esta última que aconteceu. A vice-governadora foi agredida de uma forma cruel, perversa e covarde. O texto é tudo que os manuais de jornalismo não recomendam.
O jornalismo é uma das molas mestras de uma sociedade e, por isso, o jornalista tem que ter consciência de seu papel. É verdade que nosso trabalho nem sempre agrada, afinal, muitas vezes noticiamos coisas que pessoas fazem tudo para esconder. Mas, nesse caso, não foi isso que aconteceu: foi agressão. Foi desrespeito!
O autor da publicação, cheia de preconceito e misoginia, não só desrespeitou Jacqueline Moraes: ele desrespeitou a todas as mulheres, sem exceção, não só as capixabas. E isso tem gerado uma onda de solidariedade a essa guerreira que merece respeito. Discordar do trabalho e das ideias dela é um direito de todos. Isso se chama liberdade de expressão.
Jornalismo é algo sério que não pode ser usado para matar a reputação e a honra das pessoas. Jornalismo útil busca verdades, esclarecimentos e o fornecimento de informações. O jornalismo, quando é usado para ataques pessoais, vira política e isso é o inferno do jornalismo.
Um veículo de comunicação é como qualquer empresa e tem seus interesses, isso é inegável, mas os interesses do veículo não podem vir antes do interesse da sociedade. Primeiro, são atendidos os interesses sociais em busca e uso de informações. Depois, por meio do atendimento à sociedade, o jornalismo colhe seus frutos. É assim que deve ser. Quando o interesse próprio vem primeiro, o jornalismo sai de cena e vira picuinha.
O texto não esclarece nada, não informa absolutamente nada, apenas agride a vice-governadora de uma forma inexplicável e repugnante.
Na atualidade, o exercício dessa profissão nobre (jornalismo) tem enfrentado seus maiores desafios desde a redemocratização (em 1985) e este tipo de conduta nos descredibiliza.
Usar o espaço e a voz que temos para ofender pessoas e iludir leitores é algo grave. As ofensas proferidas de forma vil, cruel e arrogante contra ela envergonham toda a imprensa capixaba.
Em um tempo em que as mulheres enfrentam tantas lutas, que noticiamos tantas injustiças contra elas, um veículo de comunicação cometer tamanha violência é chocante e covarde. O jornalista é alguém que fiscaliza tudo e que busca por esclarecimentos e justiça. Mas…
Parece que quem escreveu aquilo desconhece códigos de ética do jornalismo e parece não ter ouvido falar da Lei de Imprensa.
Criminoso, lamentável, deprimente, repugnante, reprovável, inadmissível! Um texto que parece ter saído do esgoto do jornalismo.
* O autor é economista, professor, jornalista, escritor e editor-chefe do Correio9
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OS TEXTOS ASSINADOS NÃO REFLETEM, NECESSARIAMENTE, A OPINIÃO DO CORREIO9
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