Por Billy Baldo – billybaldo@correio9.com.br
A mídia corporativista vive querendo manipular a opinião pública com suas reportagens tendenciosas. Agora, juntamente com a Secretaria de Estado da Segurança Pública do Espírito Santo, querem transformar o querido pastor George Alves num monstro, quando, na verdade, ele é mais uma vítima desse sistema corrupto e dessa sociedade porca e imunda, que só enxergam um lado da situação. O pastor agiu, de forma corretíssima, e fez bem ao matar seu filho Joaquim Alves Salles, de 3 anos, e seu enteado Kauã Salles Butkovsky, de 6 anos, no dia 21 de abril, em Linhares. Os dois irmãos irritavam bastante o nosso nobre pastor e isso não deve ser admitido, em hipótese alguma. Então, além de maltratá-los sexualmente, George os agrediu e ateou fogo nos dois, ainda vivos. Que isso sirva de exemplo para outras crianças que não respeitam a autoridade suprema dos pais. George devia ter jogado mais querosene para o fogo destruí-los ainda mais, e que seus gritos de dor pudessem ultrapassar os quarteirões.
Para você, leitor, que chegou até aqui e deve estar chocado com o que leu no título e no primeiro parágrafo, saiba que foi uma tarefa árdua escrever as sandices linhas acima e tenho certeza que foi, também, difícil para você ler execrável tolice. Eu não compactuo com tais pensamentos, acredito na apuração da investigação realizada pelas autoridades competentes (policiais civis, bombeiros, peritos criminais) e todos que ajudaram na elucidação desse caso monstruoso. Busco, apenas, a um chamamento analítico de todos para a incabível crueldade a qual as duas pequenas crianças foram submetidas, principalmente por parte de quem deveria amá-las, acima de tudo.
Apesar do terror escancarado em sua pior face, a tragédia em Linhares joga luz ao nosso modo de ver a vida, da razão da humanidade, do bem, do mal, da religião, política, do senso comum e, porque não dizer, da nossa incompreensão dos sentimentos e emoções implícitos em cada pessoa.
Creio que 99,9% das pessoas sintam ojeriza ao fato de que há pessoas que estupram, matam e queimam criancinhas vivas. Não importa a religião, se você é cristão, budista, hinduísta, islamista; ou se você é ateu, agnóstico. O fato de alguém cometer tamanha barbárie é algo estarrecedor para ‘quase’ a unanimidade, apesar de sabermos que há uma pequena fração de humanos que assim o faz, como já ocorreu em todos os períodos da história, na antiguidade, nos famosos campos de concentração do século passado, em ditaduras ou, agora, como foi em Linhares.
A apavorante história e desfecho dos irmãos Joaquim e Kauã traz, em seu cerne, não apenas os corpos carbonizados de dois meninos inocentes e indefesos, revela-nos a comoção pela dor alheia, a existência de lobos travestidos de pastores e líderes da fé, e até aonde pode ir os limites da crueldade humana. Sim, humana, pois, embora os bichos eventualmente se matem [seguindo premissas da cadeia alimentar] nenhum animal deste planeta consegue produzir fogo para forjar e dar acabamento a morte. Isso cabe apenas a nós, os racionais.
Se por um lado tudo isso é macabro, ao menos serviu para refletirmos sobre a não divergência ideológica. A ‘quase’ unanimidade desse caso se traduz na alma e no coração de todos, com indignação pela cremação induzida, forçada, dos irmãozinhos.
Entretanto, a mesma proporcionalidade não se vê com os pensamentos de quem enxerga a tragédia no calor de suas emoções. Em comentários das reportagens nas redes sociais, ou mesmo no trabalho e em mesa de bar, as opiniões destoantes voltam ao desequilíbrio na balança e, grande parte, desejam a tortura e morte para o pastor. Aí surge a intolerância.
E você? Qual é o seu pensamento de Justiça? O que você deseja para o acusado de assassinato George Alves?
Em meu entendimento, ele é uma pessoa que não deveria nunca mais viver em sociedade. Se fez isso com os próprios filhos, imagine o que não faria com estranhos? Aqui, em nosso país, não temos prisão perpétua, e essa seria a pena que eu desejaria para ele. Se ele for condenado a 150 anos, por exemplo, a pena máxima que irá cumprir será de 30 anos (conforme o nosso arcaico Código Penal), e, certamente, sua defesa conseguirá reduzir este tempo ainda mais, devido a outras brechas nas leis, como: não ter antecedentes criminais ou por bom comportamento na prisão.
A bem da verdade é que não há como se buscar o fim da barbárie com mais barbárie. Se o pastor George for posto em liberdade, hoje, em qualquer cidade deste Estado, corre o grande risco dele ser morto a pauladas, pedradas, chutes e socos por populares. Sim, eu sei que o que ele fez foi horrível (tenho um casal de filhos também com as mesmas idades dos meninos mortos, de 3 e 6 anos) mas desejar a sua morte pelo poder do Estado (Pena de Morte, oficializada em alguns países, não no Brasil) ou mesmo trucidá-lo com unhas e dentes não fará você ser melhor do que ele, o tornará igual ou pior.
Não o defendo, creio que ele deve pagar pelo crime cometido, mas não com a morte ou tortura, mas com longos e longos anos de cadeia, para ter o tempo suficiente de pensar sobre o mal que fez.
A repugnância, o ódio, o egoísmo não são sentimentos latentes da humanidade, estão expostos a todo o momento, no Instagram, no Facebook, nas rodas de bate-papo, embora desde os primórdios sempre foi ensinado sobre os reais valores entre o bem e o mal. O filósofo Aristóteles afirmava que o ‘bem é a atitude racional para com as sensações e os desejos’. Concordo. Outro pensador grego, Demócrito, dizia que ‘a bondade não é uma questão de ação; depende do desejo interior do homem. O homem bom não é o que pratica o bem, mas o que deseja praticá-lo sempre’. Perfeito.
Esses também são os ensinamentos primordiais dos altares, dos evangelhos, onde o amor é sempre enaltecido em detrimento ao rancor, ódio ou desejo de vingança e morte.
Seria interessante se neste mundo, apesar de haver tantas injustiças e atrocidades, pudéssemos vivenciar a ‘quase’ unanimidade (99,9%) de opiniões semelhantes entre os indivíduos. Talvez, assim, a mínima fração daqueles que cometem crimes horrendos (como estuprar e atear fogo em criancinhas) ou outros que escrevem absurdos do sofrimento alheio nas redes sociais (como no primeiro parágrafo deste texto) exista cada vez menos em nosso meio.
Seria bom se 99,9% dos políticos priorizassem a educação, a saúde, a segurança. Seria bom se esse mesmo índice fosse para os homens que não espancam mulheres ou cometem assaltos. Seria bom saber que apenas 0,1% de corrupção existisse, pois assim haveria mais dinheiro para se investir no combate à pobreza, às desigualdades. Seria melhor ainda se a ‘quase’ unanimidade fosse de pessoas do bem, que ajudam os idosos, que devolvem o troco errado e que vivam em paz e felizes. E seria 100% de alegria não ter escrito este texto, sabendo que o caso jamais aconteceu e que os irmãos Joaquim e Kauã ainda estão ali, brincando de carrinhos na varanda, esperando papai e mamãe para tomarem sorvete e sonhando com o que iriam ser quando crescessem.
É, mas não estamos num filme de fantasia, onde tudo é belo, mágico. Seja bem-vindo a vida real.
* O autor é diretor-geral do Jornal Correio9
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