Bruno Gaburro (Correio9)
A arte é a maior representação da evolução na sociedade humana. É por meio dela que o espírito humano manifesta toda a sua grandeza, pois, é através dela que o homem pode perpetuar-se e registrar sua cultura, sua história, sua religião, sua ciência, suas ideias, suas crenças, seu modo de viver, por fim, imortalizar seu pensamento e, consequentemente, a caracterização de uma era. Ela pode ter significados variados para cada pessoa, já que é uma forma de expressão que transmite o sentimento íntimo de cada um. Desta forma, ela se torna particular, mas, ao mesmo tempo, plural, já que a manifestação artística surge para ser contemplada por outros. Ela pode ser concebida de diversas maneiras: através da pintura, escultura, teatro, dança, cinema, música, entre tantas outras.
Em entrevista ao Correio9, o esperancense Heber Brissan Corte, de 36 anos, relatou que teve o seu primeiro contato com as artes ainda muito jovem. Quando, ainda, era apenas uma criança. Naquele tempo, ele gostava de brincar de criar filmes com seus primos, inventando roteiros e filmando as cenas. A criatividade sempre foi um de seus fortes, e vivia criando fantasias, como pequenos parques de diversão, espetáculos de circo, entre outras coisas que surgiam em sua imaginação na época. Com o passar dos anos, foi tendo mais contato com teatro, dança e atividades circenses e se apaixonando cada vez mais. Ainda na escola, seu talento já chamava atenção. Segundo Heber, sua turma sempre era a escolhida para fazer apresentações em eventos especiais na escola onde estudava, pois os professores já sabiam que seria uma belíssima exibição de talentos.
Já na adolescência, conheceu um trabalho realizado pelo grupo missionário ‘Jovens Com Uma Missão’ (Jocum) de Vitória. Foi assistindo a uma gravação em fita VHS, que continha filmagens da equipe apresentando teatros de pantomimas – atuações que fazem o menor uso possível de palavras, utilizando a linguagem corporal como meio de comunicação. Ao se deparar com todo aquele conteúdo, teve a ideia de começar a reproduzir essas peças teatrais. Então começou a ensaiar e a apresentá-las. Alguns anos depois desse contato, um grupo da Jocum se direcionou a Boa Esperança, para realizar um trabalho de evangelização com diversas manifestações artísticas como danças, teatros, música, entre outros, e foi nesta época que ele se encantou, ainda mais, com as artes, conquistando o seu coração e tornando-o um amante da arte.
Aos dezoito anos, começou a fazer um curso de teatro itinerante, em Boa Esperança, oferecido à época pelo Governo do Estado do Espírito Santo. Ele revela que várias pessoas deram início ao curso, mas, somente ele foi até o fim e conseguiu o certificado. Por conta disso, ele foi selecionado, juntamente com alunos do curso de outras cidades para apresentar uma peça teatral no Teatro Carlos Gomes, em Vitória. Empolgado com a nova formação, foi em busca de mais conhecimento na área, quando deu início a outro curso, também, em sua cidade, ministrado pela atriz da Globo, Tássia Camargo, que participava da Escolinha do Professor Raimundo, além de ter atuado em novelas. Quem também estava à frente do curso era a Nájla Raja, que trabalhava com seleção de atores para a mesma emissora de televisão.
Após o curso, Heber se mudou para o município de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais, para atuar em missões com a Jocum, desenvolvendo trabalhos artísticos e sociais em conjunto com outros membros do grupo, onde recebeu um treinamento de um dos líderes do Ministério Ceifa da Jocum – grupo que desenvolve trabalho com artes cênicas e músicas para evangelização.
Mais tarde realizou um de seus grandes sonhos, participar da escola introdutória da Jocum, conhecida como Escola de Treinamento e Discipulado (Eted). Este curso teve duração de cinco meses, sendo três meses de teoria e dois meses de prática. Durante o curso, o grupo trabalhou em diversas cidades do Brasil, como Petrópolis, no Rio de Janeiro, Senador Firmino e Dores do Turvo, em Minas Gerais. Após o término da formação, viajou para diversos estados a fim de desempenhar o papel de evangelizador e promover treinamentos a terceiros onde quer que fosse. Foi para o sertão da Paraíba realizar mais trabalhos, e depois seguiu para Porto Seguro, na Bahia, onde foi iniciado um projeto dentro de uma aldeia indígena. Lá dava aulas de teatro, dança, circo, violão, bateria e até mesmo futebol.
Em 2012 realizou sua primeira viagem internacional. Junto com mais sete membros da Jocum foi para o Oriente Médio, passando por diversos países, como Egito, Líbia, Jordânia e Israel, os quais passavam por momentos críticos à época, após as revoltas populares que ficaram conhecidas como a Primavera Árabe. Foram diversos tipos de trabalhos realizados em cada lugar, chegando a trabalhar com refugiados de diversos países, como Síria, Palestina e Sudão, e, até mesmo, trabalhar dentro da comunidade Hezbollah – organização política e paramilitar fundamentalista islâmica xiita sediada no Líbano – realizando atividades missionárias artísticas dentro de hospitais, escolas, praças e em outros diversos locais onde as pessoas necessitavam de esperança e palavras de conforto para tentarem superar aqueles momentos difíceis.
Mais tarde, foi para o Nepal para auxiliar no treinamento artístico de doze jovens nepaleses, ministrando aulas de dança, teatro e circo na capital do país, Catmandu. Depois da parte teórica, eles foram para a prática. Chegavam a caminhar até seis horas para chegar a uma vila para se apresentarem.
“Para mim, foi uma experiência incrível, consegui aprender muitas coisas com eles, como danças nepalesas e aspectos da cultura. Foi uma imersão cultural muito forte, afinal, eu passava o tempo todo com eles e fazia tudo com eles; acordava, dormia, comia, etc. Eu passei três meses vivendo como um nepalês. Contei com tradutores, não para as apresentações – pois a linguagem corporal usada passava mensagens que vão além das fronteiras da língua – mas para auxiliar na comunicação, durante os momentos de evangelização e diálogos com os nativos”, relata Heber.
Após essa experiência, foi à França, onde suas irmãs vivem. Na oportunidade, juntamente com suas irmãs, realizou diversos trabalhos em hospitais, com refugiados e até mesmo com pessoas vivendo em situação de rua, sempre levando a alegria para essas pessoas, que se encontravam em situações difíceis.
Sem desanimar, retornou ao Nepal, onde trabalhou um tempo em orfanatos, ajudando – de todas as formas possíveis – não apenas com danças, teatro e circo, mas também auxiliando em construções, na cozinha e muito mais.
“Eu acredito que a arte está em tudo, inclusive na construção. Posso dizer que meu trabalho me proporciona aprender várias coisas, a não me limitar em uma só coisa. Eu vejo que isto também é uma arte que eu pude aprender nesse tempo. A arte pra mim não é só fazer dança, teatro e circo. Ela está presente na construção, na culinária, dentre infinitas coisas”, conta Heber.
Durante todos esses anos viajando, trabalhando em diversas causas sociais, participando de grupos de missionários e tudo mais, Heber diz que é muito gratificante trabalhar em hospitais, levando alegria e esperança para pessoas enfermas, que se encontram fragilizadas.
Uma das experiências mais marcantes de sua vida foi o Dia das Crianças em que ele foi ao Hospital Infantil do Câncer, no município de Vitória, junto com alguns amigos, integrantes do Ministério Criativo, que já realiza visitas em diversos hospitais há algum tempo, proporcionando alegrias às pessoas hospitalizadas.
“Neste dia, fui vestido de palhaço para fazer algumas mágicas para as crianças, sempre brincando muito e interagindo com elas. Dentre tantos, escolhi um dos garotos, que usava cadeira de rodas para me auxiliar na apresentação. Ele ficou muito alegre, sempre com o sorriso no rosto, foi muito bonito de se ver. Mais tarde fui surpreendido pela capelã do hospital, que me agradeceu por aquele dia feliz que havíamos proporcionado, e me fez um agradecimento em especial, por conta do menino que tinha participado como meu assistente”, diz Heber.
“Ela me informou que aquele menino se encontrava em um estágio de depressão avançado há mais de seis meses, e não sorria há muito tempo. Ela revelou que, ao vê-lo na frente, junto comigo se divertindo, seu coração se encheu de esperança. Por isso, eu digo que não existe dinheiro no mundo que pague o valor da arte para mim, o que eu faço não é para ganhar dinheiro. Tudo aquilo que eu ganho, que eu recebi, que eu aprendi, é para ajudar, pois a gente nunca pode viver só, a gente sempre precisa de alguém, e quando a gente estende a mão, quando a gente ajuda alguém, isso nos faz uma pessoa melhor. Sempre tive amigos, parceiros, igrejas, organizações que me ajudaram em projetos, em viagens sem muitas vezes eu esperar por isso. Assim, aprendi que, quando você doa, é aí que você recebe muito mais”, discorre Heber.
Heber chegou a estudar em uma escola de circo, onde conseguiu uma bolsa de 50% do valor da mensalidade. Depois de um mês, teve a oportunidade de começar a trabalhar efetivamente nos espetáculos do grupo, com mágicas, acrobacias, dentre outras coisas relacionadas às atividades circenses, além, também, de começar a dar aulas para crianças de colégios que mantém uma parceria com a escola de circo em que trabalha.
Atualmente, tem um emprego numa agência de eventos em São Paulo; e tudo graças à arte.
“Decidi vir para São Paulo por conta das oportunidades de trabalho que a cidade oferece no meio artístico. Tenho feito contatos, tenho buscado voar mais alto, e farei o que for preciso para isso, afinal, nunca tive medo de trabalhar, nunca tive medo de fazer nada. Desde capinar lotes a cuspir fogo em shows. Eu faço de tudo e o que me possibilita isso é a arte, que já me proporcionou muitas outras coisas durante a minha vida. Hoje estou aqui para cuidar um pouco de mim, fazendo meu trabalho, querendo voar mais alto e fazer o que for preciso, não importando onde eu estiver, seja em qualquer lugar, fazendo o que for, eu nunca perderei a minha essência”, finaliza.
Desta forma, é possível perceber que a arte nos dá um entendimento de mundo mais amplo. Ela é um meio de comunicação entre as pessoas e os povos, ela nos dá subsídios para compreendermos melhor a vida e nos proporciona a união da nossa racionalidade com a nossa emoção.
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